Sem chuva há quase 30 dias, produtores suspenderam o plantio das lavouras de ano e meio. A estiagem na região Centro-Sul está paralisando a renovação da cana. Muitos plantadores suspenderam o plantio por acreditar que a seca vai impedir a germinação. Muitos usineiros acreditam ainda que, além da perda de até 20% da área de cultivo, pelo impossibilidade de plantar a chamada cana de ano e meio (que é cortada com 18 meses), haverá redução do volume da produção, uma vez que as lavouras pararam de se desenvolver, pela deficiência de água. Sem alcançar todo o seu potencial de crescimento, as plantas perdem volume e a correspondente capacidade de produção de glicose.
As áreas mais prejudicadas são as do Paraná, norte, noroeste e oeste do estado de São Paulo, e Mato Grosso do Sul. “A situação das lavouras está se agravando, o que deverá abortar o esperado crescimento de em torno de 7% da produção da safra 2004/05, que se inicia em abril”, diz o usineiro José Pessoa de Queiroz Bisneto, presidente do Sindicato do Açúcar Álcool do Mato Grosso do Sul.
O diretor técnico da União da Agroindústria Canavieira (Unica), Antonio de Padua Rodrigues, acredita que uma parcela significativa das lavouras canavieiras poderá permanecer vazia pelos próximos 12 meses, pela impossibilidade de cultivá-las neste primeiro trimestre. Todo ano, os plantadores de cana renovam 20% da área de cultivo, dos quais 80% são ocupados com cana de ano e meio, cujo plantio ocorre no primeiro trimestre. Essa é a variedade de cana mais produtiva, que chega a produzir 160 quilos de glicose por tonelada. A área remanescente de renovação geralmente é ocupada com a chamada cana de ano, que é cortada um ano após o plantio e cujo resultado, no que diz respeito ao teor de glicose, é menor.
O assessor técnico da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), José Ricardo Severo, informou que a estiagem já dura cerca de 30 dias na maioria das regiões produtoras da região Centro-Sul. Não há reserva hídrica no solo, o que se tornou incompatível com o plantio dos toletes, que, além disso, dificilmente germinarão sem uma boa chuva nas primeiras semanas.
Segundo Padua, a estiagem só é favorável à produção de cana no meio da safra, quando as plantas já estão suficientemente desenvolvidas e, sem a incidência de chuvas, têm a glicose concentrada, elevando o rendimento da produção de álcool ou de açúcar. Normalmente, o rendimento dos canaviais é baixo no início da safra, mesmo quando há estiagem nos meses de verão. A produção de glicose é de cerca de 120 quilos por tonelada. Em meados do ano, a produção de glicose sobe para 160 quilos por tonelada, caindo para 140 quilos por tonelada no final da safra, nos últimos meses do ano.
José Pessoa acha que o efeito maior da seca será sobre as exportações, uma vez que a tendência das usinas será de dar prioridade aos consumidores domésticos. O usineiro acredita que não há risco para o abastecimento interno, mesmo que a estiagem se prolongue ainda por várias semanas. Qualquer perda deverá atingir as receitas com as vendas ao exterior.
As chuvas deste último fim de semana, segundo José Pessoa, não corrigiram a estiagem. Para ele, houve na realidade o que se chama de manga d’água, isto é, chuvas localizadas que beneficiaram algumas áreas de produção, sem sequer molhar o solo de propriedades vizinhas. José Pessoa também acredita que uma parcela substancial das áreas destinadas à cana deverá permanecer ociosa, mesmo que volte a chover no início de abril. Isso ocorre porque fica difícil para as usinas de cana conciliar plantio com o corte de cana. Não há mão-de-obra disponível, que estará inteiramente voltada à produção de matéria-prima para o início da produção de açúcar e de álcool. Essa é a principal razão de os produtores optarem por deixar essas áreas vazias.
Quanto ao preço, a estimativa do usineiro é de que poderá haver significativa alta nos próximos meses. Para José Pessoa, a elevação das cotações deverá ser mais influenciada pela pressão da demanda por álcool do que pelos reflexos da queda da produtividade da cana, por causa da seca.