O falecido Paulo Francis ironizava a crença brasileira de que é a Casa Branca o endereço para resolver problemas com o governo americano. O Congresso, lembrava ele, é o caminho das pedras, onde se põem e se retiram obstáculos aos interesses empresariais nos Estados Unidos. Governo e setor privado, no Brasil, parecem ter acordado para a lição já escrita há tempos pelo polêmico escritor e correspondente em Nova York. O novo embaixador brasileiro nos EUA, Roberto Abdenur, e o presidente do Conselho da Câmara Americana do Comércio, Sérgio Haberfeld, vêm, independentemente, percorrendo os corredores da Colina do Capitólio, o prédio do Legislativo americano. Com ou sem George Bush, o futuro do Brasil passa também por lá.
Como mostra a queda do Brasil nos indicadores de competitividade e de preferência dos investidores, divulgados na semana passada pelo Fórum Econômico Mundial e pela consultoria A.T. Kearney, ainda é grande, porém, o trabalho a ser feito no Brasil antes de lamentarmos as barreiras de acesso ao mercado americano. As recentes medidas anunciadas pelo governo, de modernização de portos e desburocratização de embarques, se levadas à frente, podem dar um impulso ainda difícil de medir ao desempenho exportador brasileiro para os EUA.
Pragmático e objetivo, o embaixador Abdenur endossa críticas feitas por seu antecessor, Rubens Barbosa, contra a timidez do Brasil na exploração do gigantesco e, em grande parte, escancarado mercado americano. Ele conta que, em reunião recente em Miami, de três horas, com empresários do Grupo Brasil, de importadores de produtos brasileiros ou empresários do Brasil com interesses nos EUA, não ouviu “uma única queixa” contra o protecionismo americano. “Todas as preocupações e reclamações eram sobre o Brasil, nossa retaguarda, funcionamento dos portos, burocracia, estrangulamento no sistema de transportes, exageros fiscais e burocráticos”, lembra ele. Um exportador de móveis se queixou da falta de contêineres, que o impediu de embarcar suas encomendas, sob risco de perder clientes locais.
É de se esperar que as medidas de remoção de gargalos à infra-estrutura de exportação prometidas pelo governo façam efeito antes da temida desaceleração da economia mundial. Enquanto isso, é discreto, ainda, o esforço para desbloquear caminhos no mercado americano com conversas no Congresso dos EUA. Abdenur tentou marcar um encontro entre o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, e o maior líder protecionista no Congresso, o presidente da Comissão de Finanças do Senado (que também trata de comércio), Bill Grassley. O senador estava fora da cidade, mas garantiu a Abdenur que ouvirá os brasileiros.
Como o embaixador, que diz ter a ação no Congresso entre suas prioridades, Sérgio Haberfeld traçou uma estratégia de lobby no legislativo americano, espelhando-se na bem-sucedida iniciativa dos empresários mexicanos quando foi aprovado o Nafta, o acordo de livre comércio da América do Norte.