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Brasil precisa da Alca, pois não pode contar com os europeus

As negociações entre o Brasil e a União Européia estão emperradas e não há possibilidade de acordo que atenda aos nossos interesses. Não vai sair nada, neste ano, a não ser apenas mais alguns daqueles comunicados e até “memorando de entendimentos” diplomáticos em que se diz tudo sem dizer nada.

O cenário é muito simples e complicado ao mesmo tempo. Simples porque a UE não tem nenhum interesse em fazer qualquer acordo com o Brasil que implique concessões agrícolas ou industriais, mesmo porque está ainda tentando – e haja fôlego! – absorver os 10 pouco desenvolvidos que elevaram para 25 o número de seu bloco.

Ao mesmo tempo, ela espera que o Brasil não feche mesmo o acordo na Alca para ficar como única opção para nós e cobrar mais caro o preço de um acerto. A propósito, é exatamente isso o que os negociadores europeus estão fazendo a cada reunião. Cedem menos e pedem mais.

Mas é complexa também porque temos que carregar a Argentina que, imersa numa crise caótica, tem interesses que não são os nossos. Como lembrou com grande criatividade o prof. Marcos Jank, no Estado, a Argentina, no caso do Mercosul, é a “bolsa sem alça”. Só atrapalha. O Brasil precisa livrar-se dela para negociar sozinho com a UE. E, mesmo assim, não conseguirá nada.

Por quê? E a mudança de toda a comissão da UE com a posse em 1.º de novembro?

Veja o “golpe do açúcar…”

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirma que é melhor esperar do que fechar um acordo ruim até 31 de outubro. É pura ilusão. A comissão muda, mas os governos não. E agora são 25, com 15 novos pobres mais protecionistas ainda. Uma prova clara, claríssima, de como a UE vai agir, com ou sem o novo comissariado, é o que ela anunciou nesta semana em Bruxelas, na questão dos subsídios ao açúcar, guerra que nós ganhamos na OMC. Eles decidiram usar de todos os possíveis argumentos técnico-burocráticos-administrativos-legais para adiar a entrada em vigor da decisão da OMC, em nosso favor, de julho de 2005 para fins de 2006. E podem postergar ainda mais… Esse gesto mostra apenas que a UE não vai fazer nenhuma concessão ao Brasil e muito menos ao Mercosul.

Enquanto isso…

Eles se deliciam com os desentendimentos entre o Brasil e a Argentina e com os EUA. Ótimo! Quanto mais endurecermos nas negociações da Alca, melhor para eles. E isso é duplamente negativo para o Brasil.

1 – Os EUA já assinaram acordos bilaterais com os principais países sul e centro-americanos. Vamos ficar isolados ao lado de um outro companheiro “muy amigo”, a Venezuela, de Chávez. Seremos nós três, Brasil, Argentina e Venezuela, contra os EUA e toda a América Latina…

2 – Isso nos fecha ainda mais as possibilidades de atrair investimentos para o Brasil, pois as empresas que pretendem vir para o País estão mesmo é interessadas no mercado americano.

Olha o México!

Não foi à toa que o Japão acabou de assinar um acordo comercial com o México, interessado em produzir ali e exportar aos Estados Unidos, um mercado importador de US$ 1,5 trilhão! E o México já havia assinado outro acordo semelhante com a UE, pelo mesmo motivo. Enquanto, no Brasil, o primeiro-ministro japonês se emocionava ao visitar os imigrantes japoneses, mas saía de mão fechada, no México fechou um acordo das arábias para os dois países. Não houve lágrimas, mas dinheiro. Foi o segundo acordo comercial firmado pelo Japão até agora (o outro foi com Cingapura), e já neste ano atrairá investimentos de US$ 350 milhões e mais de US$ 1 bilhão nos próximos. O céu é o limite…

Comércio insignificante

O nosso comércio com o Japão, um país que importa mais de US$ 300 bilhões, é simplesmente insignificante. Até agosto, inclusive, exportamos US$ 1,7 bilhão, o que representa apenas 2,89% das vendas totais. Está em oitavo lugar na lista dos países importadores, muitíssimo distante, porém, por exemplo, da recém-chegada China, 6,31% do total. É o nosso terceiro mercado depois dos EUA, e da imprevisível Argentina, cujo comércio pode desabar a qualquer momento.

Mais sério é que o México irá competir no mercado japonês, agora mais aberto, com produtos exportados pelo Brasil, como café, tabaco, suco de laranja, carnes, principalmente frango, etc.

Só nos restam os dois

Esses números e fatos mostram a importância de o Brasil mudar completamente seu foco de negociação com os EUA e a UE, cada um esperando que as nossas negociações isoladas fracassem para exigir mais. Os empresários brasileiros estão absolutamente certos ao exigirem mudança de posição do governo com os nossos dois principais parceiros comerciais, 45,5% das exportações totais. Eles querem exportar, estão batendo todos os recordes de vendas, mas têm as mãos amarradas. Sem a Alca, as empresas que iriam produzir para exportar já estão investindo em países latino-americanos que fecharam acordos com os EUA. E não é só o Mexico, a vedete da história, mas o Chile e outros países menores também.

Não se pode ficar sonhando com um acordo Mercosul-UE. É preciso, isto sim, fechar o acordo com a Alca, pois os europeus têm interesses mais urgentes e não estão nem um pouco preocupados conosco. Para eles, somos apenas parceiros marginais.