A disputa do açúcar entre Brasil e União Européia na Organização Mundial do Comércio (OMC) será decidida nesta quarta-feira. E, na avaliação de negociadores, existem “boas perspectivas” de nova vitória brasileira contra os subsídios agrícolas, como na disputa do algodão com os Estados Unidos.
A grande preocupação da UE é com a queixa brasileira que visa os “subsídios cruzados”, quando um tipo de subsídio interno induz, na prática, mais produção açucareira para exportar com preços baixos.
O Comitê Europeu de Fabricantes de Açúcar (Cefa) já adverte que, se o Brasil ganhar, acompanhado por Austrália e Tailândia, a questão deverá ser resolvida politicamente nas negociações da Rodada de Doha da OMC, tal o impacto que uma mudança teria agora no comércio internacional do açúcar.
“Com exceção do Brasil, seriam condenados todos os principais produtores como Guatemala, África do Sul, México e Colômbia, além de Austrália e Tailândia, porque todos têm preços internos superiores ao mercado mundial e um regime que obriga parte da produção a ser exportada”, afirma Jean-Louis Barjolo, diretor da Cefa.
Brasil, Austrália e Tailândia alvejaram a exportação de açúcar da “cota C”, que abrange volumes produzidos a cada ano além das cotas A (voltados a mercado interno, com garantia de preços mínimos) e B (que podem ser exportados, com direito a subsídios). Pela política agrícola européia para o açúcar, a “cota C” deve ser exportada “sem direito a subsídios”. Ocorre que os subsídios concedidos ao açúcar das cotas A e B transferem-se à cota C e, só assim, os europeus podem vendê-lo aos preços do mercado livre internacional.
Diante dos juízes, Bruxelas argumentou que nunca se comprometera em reduzir os subsídios da “cota C”, que representa 20% de sua produção. Os europeus argumentaram que, se o raciocínio do Brasil valesse, a União Européia seria o único membro da OMC obrigado a reduzir 60% de suas subvenções às exportações, duas vezes mais que os 21% – média de 1980 a 1990 – que os outros países negociaram e aceitaram cortar até 2005.
Um tipo idêntico de programa do Canadá para seus produtores de leite foi condenado pela OMC e inspirou a queixa brasileira. Mas os europeus alegam que o programa canadense é posterior à Rodada Uruguai e, portanto, fora dos compromissos do acordo agrícola.
A outra queixa do Brasil parece mais fácil de ser ganha. O país reclama que os europeus reexportam com subsídios 1 milhão de toneladas de açúcar de ex-colônias na África, Caribe Pacífico (ACP). Pagam o preço interno europeu de 632 euros por tonelada e reexportam ao preço mundial de 202.
No total, o Brasil estima que a UE exporte com subsídios ilegais cerca de 5 milhões de toneladas de açúcar branco por ano, derrubando os preços no mercado internacional e tomando mercado dos produtores competitivos, que deixam de ganhar US$ 1 bilhão anual.
Mas a porta-voz de comércio da UE, Arancha Gonzalez, estima que a segunda parte da queixa brasileira está praticamente “encerrada” com o recente anúncio do projeto de reforma do regime de açúcar do bloco, que propôs a redução dos subsídios para exportação de um volume de 2 milhões de toneladas.
O Brasil já marcou vitória contra os subsídios dos Estados Unidos aos produtores americanos de algodão. Poderá obter outra no caso do açúcar. Com o fim da Cláusula de Paz, que protegia os subsídios dos países industrializados contra queixas na OMC, essas vitórias podem estimular outros países a abrir disputas agrícolas em plena negociação da Rodada de Doha.
A decisão preliminar do caso do açúcar será entregue confidencialmente aos beligerantes. A decisão oficial está prevista para o próximo dia 23 de setembro.