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Migrantes da cana transformam a região

Nova Luzitânia deveria se chamar Nova Minas Gerais durante a safra da cana-de-açúcar. A quantidade de migrantes vindos de cidades do Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas, que chegam ao município para o corte da cana justifica a mudança de nome. De abril a novembro, a presença de mineiros é tão intensa que encobre a importância dos descedentes de lusitanos fundadores da cidade.

A safra da cana-de-açúcar modifica a composição demográfica da região de Araçatuba e é responsável pela criação de cidades de bóias-frias, onde a presença dos trabalhadores temporários migrantes aquece a economia e modifica a rotina da população.

A reportagem da Folha da Região visitou Nova Luzitânia, a 60 quilômetros de Araçatuba, para acompanhar a transformação da cidade causada pela safra da cultura agrícola que predomina nos solos da região.

O fim de tarde nas ruas de Nova Luzitânia não é muito tranqüilo como aparenta ser em uma cidade que tem somente 2.749 habitantes. A calma é substituída pelo alvoroço dos 13 ônibus que transportam os cortadores de cana dos canaviais fornecedores de matéria-prima para a Aralco (de Santo Antônio do Aracanguá) e Destivale (Araçatuba). Os ônibus passam pelas principais ruas de Nova Luzitânia onde descem os bóias-frias.

De acordo com o presidente da Câmara Municipal, José Francisco Soares, mais conhecido por Pingo, Nova Luzitânia recebe cerca de 350 trabalhadores temporários por ano que ficam na cidade durante toda a safra. O município não possui usina nem destilaria, só canaviais. Todos os cortadores de cana são do sexo masculino e vêm de cidades do Vale do Jequitinhonha. A faixa etária é de 20 a 35 anos e a maioria tem apenas as quatro primeiras séries do ensino fundamental ou nunca freqüentou a escola. Alguns migrantes trazem a família.

Os trabalhadores residem em alojamentos, organizados pelas usinas ou pelos “gatos” (os intermediários do contrato). A vida nos alojamentos é semelhante à das repúblicas de estudantes. O espaço é coletivo, sem mordomias e com infra-estrutura essencial para dormir, afinal os cortadores só vão ao alojamento para descansar à noite. Há aqueles que preferem alugar casas e dividir o espaço com colegas mais próximos.

O vereador afirma que a migração temporária para Nova Luzitânia começou por volta de 1987, com o advento da cultura da cana na região. “Tem uns que vêm todos os anos para cá”, diz. “Outros resolveram ficar, se adaptaram à rotina da cidade e já são nossos conterrâneos.”

O prefeito Laerte Aparecido Rocha (PSDB) acredita que a migração é positiva para a cidade. “Eles são nossos irmãos e aquecem o comércio porque compram muita coisa”, reconhece. Rocha afirma que a migração temporária não traz problemas sociais para a cidade. “Já nos adaptamos a ela e adequamos a estrutura da cidade para receber os cortadores de cana.”

A assistente social da Prefeitura, Sueli Fontino, explica que as famílias dos bóias-frias são incluídas em programas de assistência social do governo estadual e federal, como o Viva Leite e o Renda Cidadã. A Prefeitura organiza feiras livres nas quartas-feiras e aos domingos para comercializar artesanato e verduras produzidas pelos migrantes que resolvem ficar na cidade depois do término da safra. O município estima a existência de cerca de 50 famílias migrantes que fixaram residência na cidade.

“Há uma integração muito positiva entre os cortadores de cana e a população”, afirma Sueli. “Eles são muito sérios e comprometidos, querem ganhar dinheiro para realizar sonhos em suas cidades de origem.”

Todos os anos, o Bar Pontual se transforma em um ponto de encontro dos safristas em Nova Luzitânia. É no local que os bóias-frias se encontram para conversar sobre a terra natal, beber e se divertir. “É uma bênção quando eles chegam. Mas quando eles vão embora o consumo desaba”, ressalta o proprietário do estabelecimento, João Lafaete de Moraes. Aliás, ele é um ex-migrante que mora na cidade desde 1998: trocou o corte da cana pelo comércio para atender pessoas cuja realidade Moraes conhece bem.