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Cenário adverso para usinas em recuperação

Poucas usinas sucroalcooleiras que entraram em colapso a partir da crise de 2008 e pediram proteção judicial estão conseguindo cumprir os planos de pagamento acordados com credores. As empresas alegam que os últimos dois anos de problemas climáticos reduziram sua capacidade de geração de caixa, já que as margens foram espremidas pelos custos mais altos e os preços aquém das expectativas de açúcar e etanol.

O resultado é que boa parte das usinas em recuperação está renegociando valores e prazos de pagamentos com seus credores. Estima-se que as empresas em recuperação controlem 37 unidades industriais, ou 11% do total de usinas existente no país.

“A projeção de geração de recursos dessas usinas está sendo revista”, afirma o advogado Thomas Benes Felsberg, sócio da Felsberg e Associados. Somente seu escritório cuida de cerca de 12 casos de usinas que pediram recuperação judicial, principalmente após 2008. Desse grupo, apenas uma conseguiu cumprir pagamentos acordados no prazo de dois anos após a decretação da recuperação judicial, segundo o advogado.

Naturalmente, há uma grande resistência dos credores em voltar para a mesa de negociação após dois anos, explica Felsberg. Sobretudo quando a relação está desgastada depois de atrasos de pagamentos acordados.

No mês passado, três credores – dois bancos e uma trading – pediram a falência da usina Laginha, localizada na cidade alagoana de mesmo nome, de propriedade do deputado federal João Lyra (PSD-AL). O Tribunal de Justiça do Estado aprovou a falência, dois dias depois voltou atrás e, no próximo dia 8, a empresa vai apresentar aos credores uma proposta de aditivo ao plano de recuperação judicial original. A Laginha alega falta de crédito bancário para lidar com intempéries nos canaviais e, principalmente, a ocorrência de uma enchente que quase destruiu a unidade, em 2010.

De forma geral, além de surpresas do clima e da conjuntura pouco favorável para o etanol, as usinas enfrentam outras dificuldades para sair da recuperação judicial, explica Felsberg. “Há diversas contestações judiciais de créditos e recursos pendentes nos tribunais que tornam difícil a saída da recuperação”, acrescenta o advogado.

Pelas regras da Lei nº 11.101, se a empresa, após a aprovação do plano, se mantiver em dia com suas obrigações ao longo de dois anos, tem o direito de requerer o encerramento do processo de recuperação. Finalizado o processo, o plano passa a funcionar como qualquer contrato – e, portanto, fica sujeito a todos os seus riscos.

Mas a saída da recuperação judicial não é um processo rápido mesmo para as empresas que estão em dia com as obrigações do plano. É o caso da Infinity Bio-Energy. A companhia entrou em recuperação judicial em novembro de 2009, teve seu plano aprovado por credores no ano seguinte e, após ser comprada pelo Bertin e captar recursos com fundos estrangeiros, pediu em 31 de maio deste ano sua saída da recuperação judicial. Passados cinco meses, a companhia ainda aguarda os trâmites legais.

A empresa designada administradora da recuperação judicial demorou 90 dias para fazer as checagens de quitação de pagamento, conta o presidente da Infinity, Douglas Oliveira. “Após esse período, a administradora se pronunciou à Justiça favoravelmente à saída da recuperação. No entanto, agora temos que aguardar o pronunciamento da Justiça e do Ministério Público. Enquanto isso, continuamos sem acesso a crédito para investir”, diz o executivo.

A Infinity foi um ponto fora da curva entre os processos de recuperação judicial de usinas. O controle da empresa foi adquirido pelo grupo Bertin, que aportou R$ 1560 milhões em 2010. Conseguiu, ainda, captar R$ 170 milhões entre outubro de 2010 e abril de 2011 com fundos estrangeiros, dispostos a correr mais riscos, e no mercado local de crédito, explica Oliveira. Outros US$ 38 milhões foram emprestados de fundos americanos no início de junho deste ano, de acordo com ele, com prazo de vencimento de três anos.

Com esses aportes, a empresa conseguiu pagar R$ 15,1 milhões aos credores quirografários (sem garantia real), R$ 18,4 milhões a outros credores e ainda converter dívida de R$ 138 milhões em ações da companhia. O Bertin detém 71% de participação no negócio e diversos fundos estrangeiros têm 21%.

Os recursos também possibilitaram investimentos agrícolas e na indústria para elevar a moagem total de cana das seis unidades – de 4,3 milhões de toneladas a safra 2010/11 para 7 milhões no ciclo 2013/14 – e ampliar a capacidade de fabricação de açúcar. “Com isso, o mix de produção da commodity no grupo saiu de 28% para 53%”, afirma Oliveira.

No entanto, explica ele, duas unidades estão paralisadas por falta de cana. “Começamos em maio a negociar empréstimos com bancos, mas cessamos as conversas diante da demora na conclusão do nosso processo na Justiça”, afirma o presidente da Infinity.