Mercado

“Estamos à margem da política energética nacional”

Os produtores de açúcar e álcool de Alagoas estão preocupados. Fora do Brasil, estão acuados pela crise econômica mundial. Eles dependem de capital estrangeiro para colocar o produto no mercado. Dentro do País, o concorrente tem virado um gigante. A gasolina recebe apoio diferenciado do governo federal e, beneficiada pela política de redução de tributos e pelo aumento na venda de automóveis, é a preferida dos consumidores.

Presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool do Estado de Alagoas (Sindaçúcar-AL), Pedro Robério de Melo Nogueira afirma: “Estamos abandonados pelo governo federal. A produção de etanol caiu desde 2008. O momento inspira cuidados, é difícil, de aperto. Estamos à margem da política energética nacional”. Ele também critica o governo do Estado, que não abre mão do ICMS, como fez Pernambuco, Paraíba e Bahia. “Já Alagoas nada fez”.

Formado em Administração de Empresas, foi na Usina Santo Antônio que ele arrumou o primeiro emprego, em 1975. Entrou como assessor e saiu diretor, em 1990, convidado pelo governo federal para conduzir a transição do Instituto do Açúcar e do Álcool para o modelo liberal, deixando o setor mais independente. Alagoano de Maceió, Pedro Robério nunca mais se afastou da cana. Único presidente do Sindaçúcar-AL que não é usineiro, ele está no comando desde 2003. No último dia 11, foi reconduzido ao cargo pela quarta vez.

Gazeta. Como o setor sucroalcooleiro de Alagoas tem enfrentado a crise econômica internacional?

Pedro Robério. Não só Alagoas, mas todo o setor nacional sofre bastante, por uma razão: o setor não dispõe de reserva de capital. Ele depende muito do capital estrangeiro. E desde o início da crise, em 2008, não tem mais acesso aos financiamentos internacionais. O setor sempre usou capital estrangeiro para ampliar a produção. Mas com a crise, o fluxo de financiamento reduziu e isso comprometeu atividades importantes para o desenvolvimento do mercado.

Que atividades foram comprometidas?

Para que a área se torne cada vez mais produtiva, desenvolvemos um programa para replantar os canaviais e aumentar o nível de renovação do solo. Mas sem financiamento, o programa está prejudicado. Todo ano, 20% das áreas eram renovadas. Hoje, só estamos renovando metade disso, 10%. Outra atividade comprometida é a irrigação. Cada vez mais enfrentamos variações climáticas e a mecanização se torna importante. É preciso adquirir máquinas, mas sem financiamento estrangeiro. Os produtores não têm condições. Por isso, enfrentamos queda na produção desde 2008, quando a crise começou.

Até hoje, o setor não conseguiu se recuperar?

Até hoje, continua havendo a escassez de financiamentos internacionais. A crise na Europa agravou o quadro. O fluxo de recursos estrangeiros continua limitado. A Europa, um importante consumidor do nosso açúcar, reduziu as importações, para dar vigor à sua política de recuperação econômica. Com isso, o momento para a indústria sucroalcooleira de todo o Brasil inspira cuidados. É um momento difícil, de aperto, que temos que enfrentar.

O governo federal não tem ajudado o setor a enfrentar a crise?

Tudo o que o governo federal fez ou diz que vai fazer para melhor aparelhar as indústrias e livrá-las dos impactos da crise não alcançou ainda o setor sucroalcooleiro. Estamos à margem da política energética nacional. No caso específico do etanol, está havendo até um abandono. Seu maior concorrente é a gasolina, que há oito anos mantém os preços congelados. O preço da gasolina não tem relação com o custo de produção. Assim, os produtores de etanol não têm como acompanhar a concorrência. Como a gasolina é produto do monopólio estatal, a Petrobras recebe o socorro de diversas medidas do governo. Já a indústria do etanol é toda privada. A gente não recebe socorro nenhum.

Qual tem sido a consequência deste abandono?

O etanol, por ser combustível limpo, renovável, deveria ser a solução energética do Brasil. Mas o setor está diminuindo a oferta por falta de estímulo, não estamos tendo condições nem de atender a demanda de automóveis flexíveis fabricados no País. A produção de etanol brasileira está desestimulada. Desde 2010, o governo federal abandonou o setor.

Mas há o discurso oficial em favor dos combustíveis renováveis. Ele é falso?

O discurso existe. Durante todo o governo Lula, havia de fato ações em defesa dos combustíveis renováveis. Mas no governo atual este empenho não se verifica mais. Enquanto a Europa e os Estados Unidos elaboram programas de incentivo às fontes renováveis de energia, o Brasil abandona o etanol. O diálogo com o poder público é difícil. O governo tem estimulado bem mais o consumo de gasolina, reduzindo a carga tributária. É uma política que vai de encontro à realidade mundial e ao que pregava o governo Lula. O País estava se tornando o mais importante produtor de etanol do mundo. Hoje, estamos desestimulados.