Mercado

Sobra mercado, falta estratégia

A área brasileira dedicada aos grãos cresceu mais de 10% e a produção aumentou perto de 30% na última década, mas esse avanço não expressou o potencial do país. Num cenário de preços recordes, as exportações batem no teto, pela disponibilidade limitada de produtos e por problemas logísticos, que vão da precariedade de rodovias e ferrovias às filas nos portos. Diante dessa contradição, a falta de uma estratégia bem definida para o agronegócio passou a ser apontada como a grande vilã. Caso nenhum plano seja colocado em prática, o Brasil pode perder a oportunidade de ampliar suas exportações, alerta uma série de discussões puxada na última semana pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).

As questões de logística, que tiram a competitividade da produção brasileira, limitam por tabela a expansão das lavouras e a agregação de valor aos grãos, aponta Décio Luiz Gazzoni, pesquisador da Embrapa Soja e integrante do Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb). “Apesar de o Brasil ter mais potencial, a Argentina teve taxas de crescimento maiores, considerando o campo e a indústria”, afirma.

Carlos Guimarães Filho e Osmar Nunes, correspondente em Umuarama

As chuvas dos últimos dois meses afetaram a concentração de ATR (Açúcar Total Recuperável) na cana-de-açúcar, prejudicando o rendimento industrial das unidades produtoras e, consequentemente, a expansão do setor.

O aumento nas produções de açúcar e etanol em relação à safra 2011/12, 5,7% e 4,5% respectivamente, só será possível porque houve expansão na moagem. Porém, os números continuam abaixo do registrado há dois anos, o que mostra que o setor não consegue crescer conforme planejado.

A queda na produtividade está no baixo teor de ATR nas lavouras brasileiras. Na safra atual, o índice está atingindo 116,57 quilos por tonelada, queda de 3% em relação à temporada anterior (120,11 quilos). No Paraná, o índice é de 125,37 quilos por toneladas, segundo informações da Associação de Produtores de Bioenergia do Estado do Paraná (Alcopar).

“Por conta do déficit hídrico no verão, a planta absorveu uma quantidade maior de água quando choveu”, explica José Adriano da Silva Dias, superintendente da Alcopar.

De acordo com dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), o setor sucroalcooleiro deve produzir 33,1 mil toneladas de açúcar, mesma quantidade registrada na safra 2010/11. Já para o etanol a previsão é de 21,4 milhões de litros, redução de 14% em relação à temporada de dois anos atrás – 25,3 milhões de litros.

O Paraná planejava colher 45 milhões de toneladas de cana, estimativa já reduzida para 40 milhões.

A falta de matéria-prima para os biocombustíveis é um problema global. Até 2021, a produção mundial de biodiesel a partir de óleo vegetal deve cair 10%, aponta o presidente da Abag, Luiz Carlos Corrêa Carvalho, com base nas projeções da Organização para Cooperação e De¬¬¬senvolvimento Econômico (OCDE) e da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Os grãos devem continuar sendo a principal matéria-prima da agroenergia, com 44% do total, seguidos pela cana (28%) e a celulose (10%).

Nesse contexto, Carvalho diz que o Brasil ainda não está preparado para atender a crescente demanda. Falta expandir as plantações e a infraestrutura necessária para armazenagem, escoamento, transporte e agregação de valor.

O problema, contudo, não se restringe a atuação governamental, argumenta Ivan Wedekin, diretor de commodities da BMF&Bovespa. O que a indicativa privada vem investindo é insuficiente, defende. André Müller Carioba, vice-presidente da indústria de máquinas AGCO, defende que o agronegócio não depende depender do governo para executar seus planos para se firmar como “motor do desenvolvimento”.

Segundo Wedekin, a ampliação do agronegócio brasileiro exige a própria elaboração de planos consistentes e abrangentes. “A tecnologia melhora os processos, mas não resolve tudo sozinha. Vamos precisar de mais terras, além de uma redução no custo dos produtores e do capital necessário para financiar essa expansão.”

Dependência da soja encarece biodiesel

Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mostram que a produção de biodiesel tem aumentado desde 2007. No último ano, o volume chegou a 16,5 milhões de barris (4% no Paraná). A principal matéria-prima, no entanto, continua sendo a soja, que teve reajuste de 70% no último ano, chegando a média de R$ 65 por saca em mercados como o do Paraná. Programas com outras alternativas, como o pinhão-manso, a mamona, demoram a ganhar escala.

Como parte das estratégias para ampliar a produção de agroenergia do Brasil, especialistas presentes no 11.º Congresso Brasileiro do Agronegócio, em São Paulo, na semana passada, alegaram que a política do país centrada no tabelamento do preço da gasolina desconsidera a importância da produção dos biocombustíveis.

“As matrizes fóssil e renovável convivem bem em todo o mundo, e aqui não precisa ser diferente”, argumentou Marcos Lutz, presidente da Cosan. André Müller Carioba, vice-presidente da indústria AGCO, acrescenta que é preciso pensar em alternativas para o fornecimento de energia. “O Brasil precisa fugir da dependência do pré-sal, de achar que essa é a grande solução para tudo”, diz.

James Fry, presidente da LMC International, defende que o país precisa entender a dinâmica de preços dos derivados de petróleo para fazer projeções mais precisas sobre o mercado de biocombustíveis. “No exterior, as empresas sabem antecipadamente o consumo de etanol e biodiesel para os próximos 12 meses. Trabalha-se com o gap entre diesel e biodiesel”.

O jornalista viajou a convite da Abag.