O governo está preparando um pacote para socorrer o setor do etanol, que enfrenta problemas. No fim de semana, publiquei duas colunas sobre o tema no jornal O Globo. Eu e a repórter Valéria Maniero ouvimos vários lados para mostrar como o assunto é complexo.
A indústria tem medo de investir, porque não vê horizonte, não sabe como o setor estará daqui a dez anos, por exemplo. As perguntas básicas não foram feitas ainda: o que o governo quer com o etanol? Ele será parte importante da matriz energética? Nos últimos anos, o que houve foi uma política de incentivo à gasolina.
Falamos com uma cortadora de cana de Barra Bonita, interior de São Paulo. A dona Rosa da Silva contou sua rotina, que mostra que a indústria avançou na relação com o trabalhador, apesar de ainda não ter chegado à condição ideal. A Rosa gosta do que faz, mas diz que o trabalho é muito pesado. Este mês ganhou R$ 400 extras, de participação nos resultados, mas ainda recebe por produção. O salário, em média, é de R$ 800. Já equipou a casa e quer comprar um carro.
Se conseguir realizar esse sonho, terá que enfrentar o dilema de qualquer motorista: abastecer com etanol, que é mais limpo, ou gasolina, que custa mais barato? Vale lembrar que o álcool tem de custar menos de 70% da gasolina para ser rentável, porque é menos eficiente como combustível. Em alguns estados, como no Rio de Janeiro, continua sendo mais vantajoso abastecer com gasolina.
Conversamos também com Edison José Ustulin, presidente da Associação dos Fornecedores de Cana de Barra Bonita. Ele planta e fornece cana para a usina da região, uma das unidades da Raízen. Acha que o governo não tem uma política de longo prazo. A visão imediatista não dá certo nessa indústria. Um investimento de renovação do canavial demora a ser feito.
A Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) diz que essa falta de definição em relação ao futuro da indústria do etanol fez com que o setor encolhesse. Empresas quebraram, entraram em recuperação judicial, por exemplo. Antonio de Padua Rodrigues, diretor e presidente interino da Unica, afirmou que é importante reduzir os impostos, mas só isso não basta.
Todos, da cortadora até o representante da indústria, pediram perspectivas. Qual será o futuro do etanol? O governo, que tem subsidiado a gasolina, precisa de ter mais clareza na sua política de combustíveis. Não adianta oferecer mais dinheiro, é preciso definir uma política para o setor.
Além disso, quando o governo fizer o pacote, não deve pensar só no grande empresário, mas em cada etapa do processo de produção, inclusive na Dona Rosa, que ainda é contratada por tempo determinado e, ao fim de cada safra, é demitida.