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Clima seco pode tirar brilho da safra de cana

Depois de realizar o maior investimento da história do setor em renovação e expansão de canaviais, as usinas de açúcar e etanol do Centro-Sul do país terão de se contentar com uma nova safra de frustrações, trazidas pela atípica estiagem do verão. A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) divulgou ontem sua primeira estimativa para temporada, na qual espera uma moagem de 509 milhões de toneladas de cana da matéria-prima. O número é pelo menos 40 milhões de toneladas menor do que o potencial criado pelo próprio segmento ao investir mais de R$ 3 bilhões no plantio de cana no ano passado.

Se for confirmado, o número da Unica será apenas 3,19% maior do que no ciclo passado (493,264 milhões de toneladas) e significará uma perda de faturamento da ordem de R$ 5 bilhões, segundo Antônio de Pádua Rodrigues, diretor-técnico da entidade. O montante, segundo ele, é o que deixará de en trar como receita do açúcar e do etanol que seriam produzidos e comercializados adicionalmente, caso não tivesse ocorrido a seca.

E a Unica alerta, ainda, que o nível de moagem de 2010/11 (557 milhões de toneladas) muito provavelmente não será atingido sequer no ano que vem – ou seja, na temporada 2013/14. “Não podemos esperar um crescimento significativo. Por causa da estiagem do começo do ano, o setor não conseguiu realizar o plantio de verão”, completou Pádua.

Para esta safra, a Unica praticamente descartou o risco de florescimento da cana, fenômeno que traz impactos negativos à quantidade de açúcar contido na cana (ATR) e que ocorreu de forma generalizada no ciclo passado. Por essa e outras razões, espera-se que o nível de ATR suba, de 137,53 quilos por tonelada de cana para 140 quilos neste ciclo que acabou de começar.

Com base nessas estimativas, a Unica projeta que a produção de açúcar vai subir 5,72%, para 33,1 milhões de toneladas – na safra 2011/12 f oram fabricados 31,308 milhões de toneladas. Com isso, a disponibilidade para exportação neste ano subiria para 24 milhões de toneladas, ante as 22,11 milhões de toneladas embarcadas de fato em 2011/12. Dessa forma, as exportações da commodity a partir do Centro-Sul se aproximariam da realizada no ciclo 2010/11, quando a região embarcou 24,64 milhões de toneladas.

Segundo a Unica, aumentaram os estoques de açúcar nas mãos das usinas no começo dessa temporada. Em abril, o volume chega a 1,7 milhão de toneladas armazenadas, 49% mais do que em abril de 2011, quando havia 1,14 milhão de toneladas estocadas. Isso se explica, em parte, porque as vendas no mercado interno foram 4,86% menores – recuaram de 9 milhões de toneladas para 8,6 milhões.

Isso porque, segundo Pádua, a safra de cana do Norte e do Nordeste do país foi maior, reduzindo a necessidade por açúcar do Centro-Sul. As vendas da região ao exterior também foram 2,5 milhões de toneladas menores. “Por causa desse cenário mais confortável de oferta, os preços internos do açúcar estão mais estáveis”, avalia o executivo da Unica.

O mix da safra 2012/13 seguirá sendo mais alcooleiro, no entanto, mais por uma limitação industrial do setor do que por uma questão de rentabilidade, pois o retorno do adoçante segue sendo maior do que o do biocombustível. Na média, a participação do açúcar sobe de 48,43% para 48,75%.

Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, uma das novas fronteiras agrícolas da cana, a produção de açúcar apresenta forte crescimento, segundo o presidente da entidade que representa as usinas locais (Biosul), Roberto Hollanda. A produção da commodity cresceu 19,51% na safra 2011/12, e o percentual de caldo de cana destinado para fabricação desse produto cresceu de 30,85%, em 2010/11, para 37,60% em 2011/12. “Muitas usinas implantaram fábricas de açúcar em suas destilarias”, conta Hollanda.

A rentabilidade do açúcar na comparação com a do etanol explica o movimento. Na safr a passada, a 2011/12, o custo da cana-de-açúcar foi de R$ 67 por tonelada, sendo que a venda de açúcar remunerou em R$ 75,57 por tonelada e a de etanol, em R$ 64,49 por tonelada (média entre anidro e hidratado). Se considerar apenas a remuneração do hidratado, esse valor recua para R$ 61,17.

Por essa razão, a produção de etanol deve crescer menos do que a de açúcar, cenário que pode mudar se também se alterar o rumo dos preços internacionais da commodity na bolsa de Nova York.

A produção de etanol no Centro-Sul cresce 4,58%, para 21,4 bilhões de litros. A fabricação de anidro deve cair 6,91%, já que o consumo também está menor com a redução da mistura do biocombustível na gasolina de 25% para 20%. A Unica estima que, por ano, essa medida significará um consumo 2 bilhões de litros menor. Já a produção de hidratado avança 11,14%, para 14,5 bilhões de litros, apesar da queda no consumo nos postos que, na safra 2011/12, foi de 5 bilhões de litros para 11,5 bilhões de litros. “O consumo tende a continuar baixo”, acredita Pádua.