Enquanto grandes grupos internacionais avaliam a possibilidade de investir em etanol, comprando ou construindo usinas, o grupo Votorantim marca posição numa área menos concorrida no Brasil, mas fundamental para a expansão do setor, a pesquisa científica de ponta, voltada ao aprimoramento de novas variedades de plantas. O avanço ocorreu por meio da Votorantim Novos Negócios (VNN), braço do grupo criado para prospectar oportunidades. Fernando Reinach, diretor-executivo da VNN, explicou à Exame porque é estratégico para o grupo Votorantim – e para o Brasil – investir em novas tecnologias voltadas à produção agrícola.
Revista EXAME – Por que o grupo Votorantim decidiu entrar no setor de açúcar e de álcool investindo em pesquisa?
Fernando Reinach – A Votorantim Novos Negócios prospecta oportunidades em áreas onde o grupo ainda não atua, mas nas quais o Brasil tem grande potencial. É o caso do agronegócio, em geral, e da cana-de-açúcar, em especial. A cana é a matéria-prima do etanol brasileiro. Hoje a produção se concentra no Centro-Sul do país, principalmente no estado de São Paulo. A crescente demanda para o plantio nessa região está encarecendo o preço da terra e elevando os custos para a construção de novas usinas. No médio prazo, isso vai elevar também o preço do produto final. O Brasil precisa de novas espécies para garantir a expansão da cana, a custos competitivos. Se quiser garantir o surgimento de novos pólos no Centro-Oeste, Norte e Nordeste, precisará de espécies adaptadas a áreas mais áridas, que hoje não são apropriadas para o cultivo da cana. Para expandir a produção no Centro-Sul, onde a quantidade de terra é cada vez menor, será necessário ter variedades mais produtivas e resistentes a doenças, que possam, na mesma área plantada, oferecer mais litros de álcool. Acreditamos que a pesquisa científica é o caminho para o Brasil expandir a produção.
EXAME – Que tipos de pesquisas são desenvolvidas hoje?
Reinach – Existem três vias de estudo. A primeira é o melhoramento clássico da planta, feito a partir do cruzamento entre espécies já existentes. A segunda é a biotecnologia, que permite a criação de novas variedades por meio da engenharia genética. A terceira é o aproveitamento da celulose na produção do etanol. Hoje a celulose da cana, que está no bagaço, é queimada para a produção de energia elétrica e de calor. Não serve para produzir álcool. Pesquisadores de vários países tentam desenvolver uma tecnologia que permita o aproveitamento comercial da celulose na produção do álcool. Quando isso ocorrer, tecnicamente será possível extrair álcool de qualquer tipo de celulose. Haverá uma revolução na produção de combustíveis renováveis.
EXAME – O grupo Votorantim pretende entrar na produção de etanol?
Reinach – Ainda não está claro para o grupo se a melhor alternativa é investir na produção. Acredito que tudo dependerá dos avanços conseguidos nos laboratórios. Por enquanto, é estratégico marcar presença no desenvolvimento de novas tecnologias para o setor.
EXAME – Quanto tem sido investido?
Reinach – Até agora, a VNN investiu de 30 milhões a 40 milhões de dólares em duas empresas de pesquisa. Uma delas é a CanaVialis, voltada exclusivamente para a cana. A outra é a Alellyx, uma empresa de biotecnologia que atua no aprimoramento da cana, do eucalipto e da laranja, culturas em que o Brasil é destaque internacionalmente. A receita com as pesquisas até agora foi zero. Mas acreditamos que esse é o caminho. O Brasil perdeu o bonde em outras áreas, como a de eletroeletrônicos, mas no agronegócio tem todas as condições de se estabelecer como líder global.
EXAME – O que pode ameaçar essa liderança?
Reinach – Os baixos investimentos em tecnologia são um problema sério. No Brasil, as pesquisas para a produção de novas variedades de cana estão concentradas em umas poucas universidades e em algumas empresas privadas. O governo está fora. Nos Estados Unidos, tanto o governo quanto grandes grupos privados estão investindo milhões em pesquisas voltadas à produção de álcool, que é feito a base de milho. O tema é tratado como uma questão vital pelos americanos. Cerca de 15% da colheita americana já é usada para fabricar etanol. Lá não há áreas para expandir o plantio. Sem novas tecnologias, a produção de energia vai começar a concorrer com a produção de alimentos. Tudo indica que nos próximos 30 anos os Estados Unidos vão reduzir drasticamente seus custos e elevar a produtividade. Se o Brasil não aumentar os investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias, vai ser ultrapassado pelos Estados Unidos.