A crescente instabilidade da economia brasileira, a reboque de um processo de sucessão presidencial onde o Governo não consegue
emplacar seu candidato e de uma crise de confiabilidade internacional sem precedentes, tem ocasionado nos últimos dias grande desvalorização cambial, através da qual o valor da moeda norte-americana vem atingindo escalada recorde nunca antes vista desde a implantação do Plano Real em 1994, o que não só reascende a preocupação da sociedade brasileira com os rumos da economia, mas principalmente assombra aqueles que possuem contratações – sobretudo as bancárias – indexadas em moeda estrangeira.
Contudo, é de se alertar que a maior parte das contratações efetuadas em solo pátrio com indexação pelo dólar (contratos bancários, contratos de compra e venda, entre outros) têm a cobrança deste encargo proibida por Lei Federal, ou seja, estão legalmente obstados de opor ao contraente os riscos da variação cambial, conforme se demonstrará adiante.
Desta norma se socorre a própria política econômica nacional, que tem por ela garantida sua soberania. Obstar a negociação desenfreada em moeda estrangeira não é, senão, impedir que a moeda nacional se lance a ignomínia do desuso, enfraquecendo-a e retirando-lhe a confiabilidade.
Ademais, também a Lei de Estabilização Econômica (Lei 8.880/94) determinou a nulidade absoluta da contratação de reajustes vinculados à variação cambial, excetuando de tal análise os casos em que houver autorização anterior em Lei Federal.
Lembrando que para o caso de crédito de fomento (rural e industrial) o CMN – Conselho Monetário Nacional -, autorizou o repasse de variação cambial para os tomadores de mútuo através de Resoluções (2.148/95 e 2.483/98, conhecidas como “63 caipiras”), não se pode perder de vista que, nada obstante seja o Conselho Monetário Nacional a autoridade competente para estabelecer as condições das operações de crédito de fomento, este poder normativo está subjugado ao princípio da hierarquia das leis, ou seja, “as condições das operações de crédito rural, sob quaisquer de suas modalidades”, que forem estabelecidas pelo CMN não poderão contrariar ou violar nem as leis especiais (diretamente vinculadas a estas resoluções), nem as leis gerais e muito menos a Constituição Federal.
Este poder legiferante concedido ao CMN pelo art. 14 da Lei 4.829/65 está estrita e diretamente subjugado aos PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA CONSTITUCIONALIDADE.
Desta forma, é lógico concluir que este poder do CMN-BACEN de editar RESOLUÇÕES, CIRCULARES E CARTAS CIRCULARES não poderá extrapolar, criando normativos que violem preceitos, conteúdos, mens legis e ditames, enfim, da própria norma hierarquicamente superior que CONCEDEU PODER ao ÓRGÃO LEGIFERANTE, e das Leis Ordinárias Gerais, nem tampouco violar a Constituição.
A ilegalidade e inconstitucionalidade das resoluções do BACEN conhecidas como “63 – caipira”, portanto, no que tange à permissão de vinculação do dólar nas operações de mútuo de crédito rural, é patente: há violação do Ordenamento Jurídico por ousar autorizar por Resolução (ato normativo inferior) pacto de repasse de variação cambial quando tal feito somente poderá ser autorizado por Lei Federal (ato normativo superior).
Com efeito, em toda esta legislação específica de crédito rural e industrial – LEIS ESPECIAIS – não há qualquer previsão expressa da possibilidade de se utilizar a moeda estrangeira como parâmetro de correção da dívida ou de pagamento em variação cambial. Não há expressa previsão legal destas hipóteses, absolutamente.
Por sua vez, o artigo 6º. da Lei 8.880/94 – Lei Federal de alcance nacional e imediato – taxativamente elencou as exceções que poderiam ser suscetíveis de contratação em dólar, nas quais não se incluem nem o direito bancário comum, nem tampouco o crédito de fomento (crédito rural, industrial e comercial cedular).
Assim, qualquer contratação que vincule reajuste à variação cambial em crédito de fomento é nula de pleno direito, pois não há NENHUMA LEI FEDERAL que autorize tal contratação, assim como as determinações do CMN neste sentido, pois falta a estas Resoluções competência legiferante hierárquica para tal mister.
Para as dívidas de natureza rural, observemos que a finalidade do crédito rural é o bem estar do povo, e não do banqueiro, motivo pelo qual o fortalecimento econômico deve estar ao lado da produtividade, com vistas a incentivar a produção de alimentos, e não desestimulá-la. Neste sentido, o art. 1º da Lei 4.829/65.
Por qualquer processo exegético que se analise as Resoluções 2.148/95 e 2.483/98, deverá o intérprete legal pugnar pela sua ilegalidade, o quanto ferem despudoradamente o Ordenamento Jurídico como um todo e, em especial, a LEI DE CRÉDITO RURAL – LEI DE FOMENTO.
Ainda, para as contratações em geral, sobretudo as bancárias, é de se observar que o pacto da variação cambial gera um abissal desequilíbrio entre a prestação (principal mutuado em reais)) e contraprestação (valores a serem pagos em dólares).
Para tais casos, o próprio Código de Defesa do Consumidor imputa, em seus art. 4º, III, e art. 6º, II, V, nulidade da cláusula que estipula vantagem exagerada a uma das partes, na exata medida em que fere o princípio da equivalência contratual. Se a cláusula contratual traz vantagem excessiva para uma das partes em detrimento da outra (como é o caso da indexação por moeda estrangeira) o resultado é uma contrariedade à ordem pública, não prevalecendo o pactuado pelas partes, observando-se que o legislador pátrio tratou de assegurar ao consumidor os direitos e prerrogativas mais elementares, tais como os de discutir as cláusulas e condições do contrato de forma verdadeira e situar o contrato sob a égide da boa-fé e do equilíbrio contratual, bem como garantir possibilidade de sua revisão em casos que se externem prestações desproporcionais ab initio, ou que não o eram por ocasião da firmação do contrato, mas vieram a sê-lo por fator superveniente e extrínseco ao contrato.
O medo e o desespero se instalaram entre os tomadores de empréstimos em moeda estrangeira. Entretanto, existe uma legislação forte que protege estas dívidas em DÓLAR, no sentido de obstá-las, trazendo o valor das mesmas aos patamares legais.
O autor é o atual presidente do INEACREF – Instituto Nacional de Estudos Avançados em Crédito de Fomento – Crédito Rural e Crédito Industrial, de São Paulo (SP). Mais informações e orientações: (41) 3029-4435 ou www.lybor.com.br