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‘Não tem jeito, preciso fazer isso’, diz lavrador

Ele tem a mesma rotina desde 1982. Acorda às 4h, começa a trabalhar três horas depois, chega em casa às 17h, toma banho, janta e vai dormir.

O bóia-fria Aurindo Manoel dos Santos, que mora em Cruz das Posses, região de Ribeirão Preto, é solteiro, mas não encontra ânimo para ir aos bares da cidade, já que os 45 anos “pesam” nas costas. Ele conta que, muitas vezes, tem cãibras por causa da rotina diária. Santos, como seus colegas, trabalha cinco dias e folga um.

Natural de Livramento (BA), onde deixou mulher e três filhos adolescentes, o trabalhador rural passa a safra com renda mensal de R$ 250, dinheiro que tem de ser suficiente para o pagamento de aluguel, as contas mensais e a alimentação.

O salário é de R$ 550, mas ele envia R$ 300 para a família na Bahia. “Não tem jeito, preciso fazer isso. Tenho muita saudade deles. Vivo do que é possível eu ter.”

Santos integra um grupo de bóias-frias que foi acompanhado na última quinta-feira pela reportagem da Folha até um canavial de Jardinópolis, cidade vizinha a Ribeirão Preto.

O grupo, de Cruz das Posses, viajou quase uma hora por rodovias vicinais esburacadas e estradas de terra até chegar ao canavial definido para o dia. No meio do trajeto, o ônibus quebrou e os trabalhadores tiveram de aguardar outro veículo, enviado pela usina.

Santos corta cerca de dez toneladas de cana diariamente e se alimenta de arroz, feijão, carne -quando tem- e salada. A bóia, ainda quente, é ingerida pela primeira vez às 7h, antes de o corte da cana começar.

O almoço é às 10h, de forma improvisada, sentado em um cantil no meio do canavial. O prato é o mesmo, literalmente. Três horas depois, Santos come a mesma marmita, na “merenda”. “Temos de comer cedinho para agüentar o dia. Mesmo ficando fria depois, tem de ser assim para dar conta.”

A situação é a mesma vivida pela bóia-fria Maurise Maria Bispo, 40, natural de Recife (PE), mas que há 20 anos está em Cruz das Posses trabalhando no corte de cana. Como outras mulheres, acumula as funções da lavoura com as tarefas domésticas.

“É um trabalho cansativo demais. Já soube da história de um cortador que morreu no campo, abraçado à cana. É triste demais”, diz ela, que tem renda mensal inferior a R$ 400 e é vaidosa -vai à lavoura com esmalte nas unhas e dois brincos. (MT)

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