Filho de produtor de açúcar e álcool, Jorge Wolney Atalla Júnior sabe melhor do que muitas pessoas a rotina dos canaviais do Brasil. Da cana, sai o açúcar e o álcool. Da mesma cana também saiu a inspiração deste executivo de 32 anos que virou cineasta. Com uma idéia na cabeça e uma câmera na mão, Atalla dirigiu “A Vida em Cana”, longa metragem de 69 minutos, premiadíssimo no exterior. O documentário participou de vários festivais e foi bem recebido pela crítica.
Rodado em 1999, durante os meses da colheita de cana-de-açúcar, de maio a novembro, no Centro-Sul do Brasil, principal região produtora do País, responsável por mais de 80% da produção nacional, Atalla registrou o dia-a-dia dos cortadores de cana, principais protagonistas deste documentário. Cada suor, cada detalhezinho, nada passou em branco. O realismo tratado neste longa fez de Atalla uma revelação. “Nem eu mesmo esperava tamanha repercussão”, disse o jovem executivo e cineasta em entrevista ao JornalCana.
Com muito sucesso por onde é exibido, o longa metragem “A Vida em Cana” mostra a realidade dos trabalhadores rurais, pessoas que madrugam, enfrentam as agruras de um trabalho considerado rústico. Dos canaviais, eles tiram o salário, o sustento da família, ganham a vida pegando no pesado, mas não perdem a vontade de continuar batalhando, mesmo com o sofrimento estampado no rosto. Tudo isto retratado sutilmente pela câmera do cineasta, que desde criança está acostumado à realidade dos canaviais paulistas.
Formado em economia na Universidade do Texas, Estados Unidos, e pós-graduado na Business School Lausanne, na Suíça, Atalla sempre trabalhou nas usinas sucroalcooleiras de seu pai, o tradicional empresário Jorge Wolney Atalla. Seu pai é proprietário das usinas Central do Paraná, na cidade de Porecatu (PR), e Central Paulista de Açúcar, em Jaú (SP). Em 1998, Atalla resolveu dar um rumo novo à sua vida. Foi para os Estados Unidos fazer um curso de cinema na New York Film Academy. Seu trabalho de formatura deu provas de seu potencial talento: um curta metragem de uma história verídica, chamado “Princess”, que recebeu um Honorable Mention Award no Columbus International Film Festival.
Ao voltar para o Brasil, Atalla trouxe na mala um sonho, que logo se concretizou. O empresário se dedicou integralmente ao seu primeiro e premiadíssimo longa metragem, o documentário “A Vida em Cana”, produção que durou seis meses de filmagem nos canaviais e que foi finalizado somente em 2001.
Uma das mais tradicionais atividades agrícolas do País, o setor sucroalcooleiro emprega atualmente 1,3 milhão de trabalhadores rurais, dos quais 800 mil são cortadores de cana. No momento, o maior drama destes trabalhadores rurais é a tecnologia, pois desemprega. A mecanização dos canaviais é hoje o maior inimigo destes trabalhadores, instrumento que pode tirar o emprego de milhares de pessoas. Uma lei ambiental aprovada pelo Congresso Nacional determina que até 2015 praticamente toda a colheita de cana-de-açúcar do País deve ser mecanizada. O cineasta acredita que pode ter filmado a última geração de cortadores de cana, tamanha a rápida modernização do setor. Os conhecidos “senhores do engenho”, famosos em um passado não tão distante, hoje são empresários globalizados, plugados na internet e em agências de notícias. Em suas confortáveis cadeiras de seus escritórios equipados com ar-condicionado e aparelhos de última geração, eles acompanham as oscilações dos preços internacionais do açúcar, um dos principais produtos exportados pelo Brasil. Atualmente o setor movimenta mais de US$ 10 bilhões por ano. O Brasil é o maior exportador mundial de açúcar, com 25% de participação no mercado mundial. As usinas sucroalcooleiras batalham para que o álcool seja internacionalizado e comercializado mundialmente, assim como o açúcar. Atalla sabe o valor da cana. Bom trabalhada, a cana dá lucro. A mesma cana também dá prêmios e reconhecimento a este jovem empresário que decidiu ir atrás de seu sonho.
JornalCana – Como você decidiu se tornar cineasta?
Jorge Wolney Atalla Júnior – Sempre gostei de cinema. Em 1998, aos 28 anos, decidi ir para os Estados Unidos para fazer cinema. Eu me arrisquei e deu certo.
JC – Como foi a decisão de filmar sobre canaviais?
Atalla – Eu sempre convivi em usinas desde pequeno. Gostava do dia-a-dia dessas pessoas. Eu já estava familiarizado com o assunto e as pessoas que lá trabalhavam. Foi praticamente uma extensão de minha vida.
JC – Como esta decisão repercutiu na família?
Atalla – Não tive nenhum problema. Pelo contrário, recebi muito apoio e carinho de minha família, o que é muito positivo quando você toma uma decisão importante como esta.
JC – O filme teve boa repercussão no setor sucroalcooleiro?
Atalla – Muitas pessoas acharam estranho eu retratar a vida dos cortadores de cana, mostrando a realidade como ela é. Durante a apresentação do longa metragem na União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica), principal entidade que representa do setor no Centro-Sul, muitos empresários aplaudiram de pé o documentário.
JC – Você continua trabalhando nas usinas de seu pai?
Atalla – Continuo fazendo o meu trabalho normalmente. Sou um dos diretores do grupo e pretendo continuar trabalhando nas usinas. Vou conciliar as duas profissões numa boa.
JC – Como foi a repercussão de seu documentário?
Atalla – Houve uma maior repercussão no exterior, onde esta realidade não é tão presente como no Brasil. Recebi um bom retorno de Nova York. Em nosso País, as pessoas estão mais acostumadas com este tipo de trabalho, o que é mais fácil entender o drama.
JC – Esperava que o documentário tivesse repercussão tão positiva?
Atalla – Sinceramente foi uma surpresa. Quando eu inscrevi meu trabalho no festival de Recife e ganhei prêmios, fiquei extremamente surpreendido.
JC – De quanto foi o seu investimento no longa metragem?
Atalla – O investimento foi de aproximadamente US$ 30 mil, sem contar as viagens para divulgação do trabalho. Só para ter uma idéia viajei para Los Angeles seis vezes para divulgar o meu longa. Tenho de investir bastante em marketing.
JC – Já tem projeto para o novo longa? Pode adiantar o roteiro?
Atalla – Já estou trabalhando em um novo roteiro de um longa metragem, mas não posso adiantar nada ainda.
JC – Quando o longa “A vida em Cana” será divulgado no Brasil?
Atalla – Por enquanto, as apresentações estão ainda em festivais. No próximo mês de junho deve ser apresentado ao grande público do País. O documentário também é apresentado no interior de São Paulo. Temos umas cem cópias exibidas pelas escolas do interior.
JC – Você já foi procurado por profissionais do exterior?
Atalla – Um produtor de Los Angeles, Estados Unidos, já se ofereceu para produzir meu próximo longa.
JC – Tem vontade de largar tudo pelo cinema?
Atalla – Por enquanto, o cinema é como um momento de descanso. Faço como um hobby para ficar mais relaxado.
JC – Qual o prêmio que você considera mais importante?
Atalla – Eu considero o Satélite de Ouro, que recebi em janeiro deste ano, o mais importante da minha carreira. Foi um prêmio concedido pelos profissionais da imprensa internacional, o que me deixou bastante orgulhoso. Eu estava concorrendo com pessoas importantes, como o Martin Scorsese. O fato de eu ter ganho este prêmio me deixou muito envaidecido.
Conheça as principais premiações do cineasta
Prêmio Satélite de Ouro 2002 (Academia da Imprensa Internacional)
Melhor Filme Documentário
CINE Aguia de Ouro 2002
Melhor Documentário
Prêmio Margarida de Prata – 2001
Melhor Documentário
Festival de Cinema do Recife
Melhor Documentário, Melhor Diretor, Melhor Montagem
New York International Independent Film and Video Festival
Melhor Fotografia
New York International Independent Film Festival – Los Angeles
Melhor Documentário Internacional
Rhode Island International Film Festival
1º Lugar – Melhor Documentário
Big Bear Lake International Film
Melhor Documentário – Júri Popular
Long Beach International Film Festival
Melhor Filme Longa Metragem – Júri Popular
Medalha de Mérito do Júri Oficial
Columbus International Film Festival
Menção Honrosa
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