Mercado

A economia brasileira em 2007

A construção de um cenário para a economia brasileira em 2007 deve partir, como sempre, de uma análise da economia mundial e, em particular, da economia americana. Desde o ano passado trava-se um debate sobre a natureza da desaceleração dos EUA, em torno de três alternativas: recessão, desaceleração suave (nossa hipótese desde o ano passado) ou uma rápida desaceleração seguida de um novo surto de forte crescimento. As informações desde o início do ano praticamente enterraram a chance de uma recessão, de sorte que o debate se dá em torno de duas alternativas apenas. Os dados da semana passada, especialmente o da criação de novos empregos, sugerem a prevalência da idéia do pouso suave (PIB no primeiro trimestre crescendo entre 1% e 2%). A inflação converge firme para a área de conforto, próxima a 2% no núcleo, de sorte que o último comunicado do FED deu grande ânimo aos mercados, inclusive o nosso, pois sugere estabilidade e talvez lá na frente, nova baixa nos juros.

Por outro lado, o ajuste no mercado automotivo e no setor residencial inequivocamente avançou. Os otimistas vêem aí a chave de uma forte recuperação na atividade, pois o consumo poderia voltar a crescer, associado ao bom desempenho de exportações e investimentos. Eventualmente, o reaquecimento da economia poderia pressionar o mercado de trabalho e levar, lá na frente, a um aperto na política monetária. Para os mercados financeiros, acertar nesta questão determina boa parte dos resultados do ano.

De qualquer forma estamos falando de mais um ano de bom crescimento mundial, embora menor que o do ano passado. Conseqüentemente, o comércio internacional também crescerá a taxas saudáveis. No caso de commodities, continuamos com a hipótese de um preço do petróleo oscilando em torno de 60 dólares, condizente com uma demanda ainda alta, mas algo mais moderada. Alguns metais industriais, como o cobre e o alumínio, terão ofertas normalizadas, mas a demanda de matérias-primas como um todo seguirá bem. Na área agrícola é possível que os grãos subam ainda mais, devido à corrida para a produção de biocombustíveis, especialmente nos Estados Unidos. Entretanto, o índice de preços de commodities não deverá recuperar o terreno perdido desde agosto passado, quando o mercado virou. Medido pelo CRB (um dos mais populares índices de preços de commodities), o mercado veio de 355 pontos em agosto para 300 hoje.

Somando tudo, o cenário internacional segue muito bom para o Brasil, especialmente na área de comércio exterior, onde se desenha um excelente saldo comercial. De fato, como os resultados do começo do ano sugerem que tanto importações como exportações seguem crescendo de forma rápida, projetamos agora um saldo comercial de 41 bilhões de dólares, apenas um pouco menor que o do ano passado. Com isto, o fluxo cambial segue elevado e o dólar perdendo valor, apesar das elevadas compras feitas pelo Banco Central. No que tange às exportações, o impulso continua sendo dado essencialmente pelas commodities, como mostram os resultados do mês de janeiro: a soma da receita dos produtos básicos, semimanufaturados e de alguns manufaturados tipo suco de laranja, álcool e açúcar mostra uma elevação de 26% contra 10% dos demais manufaturados. Não tenho nenhum preconceito quanto a isto, mas é importante registrar a perda de gás das vendas de manufaturados não commodities, que seguirá ocorrendo neste ano.

A questão dos investimentos de infra-estrutura está há quilômetros de ser resolvida porque remanescem lacunas regulatórias e ambientais

No campo inflacionário, a tranqüilidade é total e, como todo mundo, esperamos que o IPCA fique abaixo da meta por mais um ano, o que é excelente e permite reduções adicionais na taxa de juros, que imaginamos chegar a 11,75% ou 12% no final do ano. Entretanto, não esperamos que os preços de gasolina e diesel sejam reduzidos para um nível mais próximo das paridades atuais, como está ocorrendo com a nafta e o querosene de aviação, porque acreditamos que as autoridades darão preferência ao reforço do caixa da Petrobras.

Finalmente, vem a questão do crescimento. Sabemos que a forte redução na Selic ocorrida ao longo do ano passado abre em 2007 um espaço fiscal importante, pois o gasto com juros será, em princípio, menor. Esta “folga” poderia ser usada para reduzir endividamento público, tributos ou elevar gastos públicos, de custeio e investimento. A redução de dívida ou tributos permitiria quedas maiores nas taxas de juros e crescimento do investimento privado, com efeitos positivos a curto e longo prazo. Entretanto, é óbvio que o governo preferiu o caminho de continuar elevando os gastos públicos. Ademais, decidiu que as reformas, especialmente a da previdência, não são necessárias, um grave equívoco, como discutiu neste espaço Gustavo Loyola.

Aliás, a demonstração que o déficit da previdência não existe, quando se desconsideram as renúncias fiscais, aposentadorias rurais, e outros itens, lembra muito antigas análises de inflação: ante um número alto descontavam-se as altas do chuchu, mensalidades escolares e outras, para dizer que sem estes itens a inflação era até razoável.

Considerando o que o PAC não tem, as elevações de gastos já decididas, e que grande parte dos investimentos ali previstos ou já estavam programados ou são muito vagos, sobra muito pouco para alterar a trajetória de longo prazo da economia brasileira. A questão dos investimentos de infra-estrutura está há quilômetros de ser resolvida, porque remanescem lacunas regulatórias, ambientais e outras, como a idéia de criar uma estatal para cuidar das estradas que vierem a ser concedidas. Mesmo que tenha sido apenas um balão de ensaio, esta idéia não auxilia na solução dos problemas de transporte rodoviário. Sua maior utilidade é política, a de dar um discurso para o presidente da República.

Continuaremos a crescer lentamente, apesar das excelentes condições internacionais. Neste ano, em particular, o crescimento será marginalmente maior que o do ano passado, muito por conta da construção civil, que passa por excelente momento.

José Roberto Mendonça de Barros é economista da MB Associados. Escreve mensalmente às quintas-feiras.

http://www.valor.com.br/valoreconomico/285/primeirocaderno/opiniao/A+economia+brasileira+em+2007,,,58,4146660.html