Mercado

A gangorra dos preços

Todo mundo está reclamando, com razão, sobre os aumentos de preços do

álcool, inclusive os produtores. Foi tudo muito rápido e o consumidor

reclama porque de repente viu o álcool subir muito e sem explicação, e há exatos quatros meses, o produtor viu o preço cair muito sem nenhuma explicação também. O que é que realmente está acontecendo? Primeiro, somos uma economia de mercado. Produzimos um produto que flutua de acordo com o humor do mercado que, na verdade, é soberano e dita as regras do jogo e os preços.

Cartel, nós? Puxa vida! Somos mais de 300 unidades produtoras de álcool no país! Cartel são outros, que nós conhecemos muito bem. O setor é muito pulverizado, e a maior usina brasileira, sozinha, representa em torno de 2% da produção total. O que o setor sucroalcooleiro precisa, e não consegue fazer com eficiência, é esclarecer a opinião pública.

Porque será que nós vendemos álcool a R$ 0,14 o litro, em 1999, preço este abaixo de qualquer custo de produção? Afronta ao mercado? Garanto que não!

Porque este preço foi a R$ 0,60 em dezembro de 2000, caiu novamente para R$ 0,32 em junho/julho deste ano e agora foi para R$ 0,70? Com certeza todos estes movimentos foram ditados pelo mercado e seu humor, que não é dos melhores. Em 1997, quando o governo deixou de regulamentar o mercado de álcool, o produto estava a R$ 0,44 o litro.

Quando bateu a incrível marca de R$ 0,14/litro, a coisa foi tão brava que o sistema financeiro praticamente deixou de operar com o setor, que caminhava para a bancarrota e, com ele, toda a cadeia produtiva. A sociedade se mobilizou para bater um papo com o mercado. Os empresários, trabalhadores, o governador Mário Covas, secretarias de estado e ministérios, todos, enfim, se reuniram em torno do Pacto pelo Emprego no Agronegócio Sucroalcooleiro.

Com que finalidade? Resgatar os preços para viabilizar o setor e garantir a manutenção de 1,2 milhão de empregos diretos no país, metade no Estado de São Paulo. Aí, quando os preços começaram a se recuperar, fomos acusados de que aproveitamos o Pacto para subir os preços ao nosso bel prazer!

Dizer que o dólar não tem nada a ver com nada é uma leviandade ou ignorância. A verdade é que quando se tem o dólar perto dos R$ 4, as

conseqüências aparecem cedo ou tarde e, por ironia, até mesmo quando a moeda norte-americana começa a baixar, como está acontecendo. O superávit da balança comercial, por exemplo, não é feito de vento. Não subir os preços dos derivados de petróleo é uma decisão política que somente o governo federal pode tomar quando se tem uma companhia forte como a Petrobrás que apresenta ótimos resultados financeiros.

A estatal do petróleo obteve em 2001 receita de quase R$ 100 bilhões e lucro líquido de R$ 13.266 bilhões. Números que dão suporte para arcar com prejuízos mensais estimados em R$ 1,14 bilhão desde julho, devido ao preço dos derivados represados no período pré-eleitoral, mas que agora são repassados ao consumidor. As perdas provocadas pela defasagem cambial, como se vê, são recuperadas. Nós, produtores, tivemos no mesmo período (junho-setembro) um prejuízo acumulado de R$ 500 milhões com a queda do preço do álcool. Uma perda não recuperada.

Importante deixar claro ainda que o preço do álcool subiu de R$ 0,60 em dezembro de 2000, para R$ 0,70 hoje. O papel aceita tudo e através dele podemos dizer o que quiser. Poderíamos dizer que subiu quase 500%, de R$ 0,14, em 99, para os atuais R$ 0,70. Mas não é verdadeiro. O que consideramos é que houve uma recuperação de preço perdido. Vamos deixar claro que subiu, sim, R$ 0,10 (dez centavos).

De positivo, o álcool custa hoje em torno de 58% do preço da gasolina e seu valor energético é de 80% em relação ao derivado de petróleo. Não podemos é mantê-lo em 40%, como estava. Portanto, o álcool continua viável economicamente além de ser a melhor alternativa de combustível de biomassa existente no mercado e inteiramente nacional.

Para se falar do álcool anidro, misturado à gasolina, é necessário um

capít lo à parte para explicar que ele não forçou o aumento de preços da gasolina. Pelo contrário, por ser mais barato, a mistura ajuda a segurar a alta de preços.

Agora, uma categoria da importância do setor sucroalcooleiro não tem o

direito de não colocar a opinião pública informada da real situação e quando ocorre o que tem ocorrido recentemente, com uma enxurrada de notícias em que somos tratados como vilões e que denigrem a imagem do álcool, perde o Brasil porque o único combustível totalmente nacional cai no descrédito, conseqüentemente, perde o produtor com a desconfiança do mercado e perde o consumidor a oportunidade de ter um produto mais barato do que os derivados de petróleo – o álcool, um produto com a cara do povo brasileiro, que aos trancos e barrancos tenta sobreviver. Enfim, perdemos todos nós.

Tenho sido procurado por empresários e jornalistas que querem entender o que está acontecendo e busco analisar a questão à luz da razão. O que não dá para agüentar é ver o setor acusado de aumento abusivo, o que caracteriza uma atitude antipatriótica. Postura que, definitivamente, não se coaduna com a política adotada, por nós empresários, de trabalhar para transformar o álcool em matriz energética e defender os interesses nacionais. Quando é que vamos compreender que se o petróleo é deles, o álcool é nosso?

Maurílio Biagi Filho é Conselheiro da União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo – UNICA, vice-presidente do Ciesp e vice-presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base – ABDIB

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