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Cogeração ainda patina em meio a indefinições

Ao longo da última década, um dado pairou sobre o setor sucroalcooleiro como uma clara demonstração de potencial e desafio: os canaviais do país escondem uma capacidade de geração de energia elétrica de cerca de 12 mil MW, quase a mesma da usina hidrelétrica de Itaipu. Para alguns especialistas, muito pouco desse potencial foi transformado em realidade, graças a questões como preços da energia, considerados ainda pouco atraentes, e limitações da rede elétrica que dificultam a interconexão dos projetos.

Há, contudo, a expectativa de que, com novas tecnologias – principalmente caldeiras de maior rendimento -, com uma maior disponibilidade de biomassa com o fim das queimadas e com uma solução dos problemas de acesso à rede elétrica a cogeração cresça exponencialmente. “Se forem resolvidas limitações da re de, os investimentos podem chegar a uma faixa de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões nos próximos cinco ou seis anos”, prevê o CEO da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen), Carlos Roberto Silvestrin.

“O que verificamos, nos últimos leilões, é que esse potencial não se desenvolveu. Foram contratados apenas 500 MW no leilão de garantia, o que é um volume ínfimo diante do potencial. Somente em São Paulo existe uma capacidade ainda não aproveitada de 3 mil MW”, diz a gerente do Núcleo de Energia Térmica e Fontes Alternativas da Andrade & Canellas, Mônica Souza. Segundo ela, os empresários do setor sucroalcooleiro consideram que taxas de retorno de 11% a 12% praticadas em segmentos do setor elétrico não são muito interessantes.

“A receita da energia elétrica é secundária para o usineiro, que está acostumado a mercados mais voláteis. A produção de energia elétrica oferece preços e taxas de retorno menores, embo ra seja um mercado seguro”, acrescenta ela.

Mônica destaca ainda que a decisão de muitas usinas mais antigas de não fazer o retrofit (reforma de usinas existentes com a introdução de tecnologias mais eficientes) foi consequência de uma frustração com os preços praticados nos leilões. “As usinas eólicas acabaram sendo mais competitivas no último leilão de contratação de energia”, diz ela. “A venda da energia gerada pelas eólicas a R$ 130 o MWh inviabilizou a geração com o uso de biomassa”, complementa o diretor de projetos da Andrade & Canellas, André Crisafulli.

Para a empresa, a maior competitividade apresentada pela energia eólica pode ser um fator conjuntural. Com a crise financeira internacional, houve sobra de peças e equipamentos de geração eólica em vários mercados, o que contribuiu para a redução dos preços.

Silvestrin, CEO da Cogen, mantém uma visão mais otimista. Segundo ele, vários fatores tendem a estimular a bioeletricidade, como é chamada a eletrici dade gerada a partir da biomassa. Ele considera, por exemplo, que a produção de energia a partir da biomassa da cana deverá ser favorecida em meio ao processo de concentração em curso no setor. Segundo dados da Cogen, os cinco principais grupos em processamento de cana tinham, juntos, 12% do mercado no ano passado, agora já têm 30% e contarão, em cinco anos, com 40%. “Essas empresas entram de forma estruturada na cogeração”, diz ele.

Silvestrin destaca que a cogeração de energia elétrica tem representado para as empresas novas um porto seguro. “Os contratos de fornecimento de energia elétrica são reajustados pelo IPCA e tem duração de 20 anos. Representam uma importante garantia de recebíveis para as empresas novas, que não ficam totalmente expostas às oscilações do etanol e do açúcar.”