Os últimos meses foram de sufoco para os proprietários de veículos flex, frente aos elevados preços do etanol nos postos de abastecimento. Mas, com o início da nova safra, aberta em abril, o biocombustível deve voltar a ficar competitivo. Enquanto o período de aperto se dissipa, a pergunta que persiste é o que causou a crise do etanol e se ela pode se repetir no futuro.
Para o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) Marcos Jank, resolver a volatilidade do preço do álcool é fácil. O problema mais urgente é lidar com a falta de apetite para novos projetos. “Se for falar de crise, a verdadeira crise do setor é de crescimento”, afirma. Em entrevista à EXAME.com, Jank expl ica as altas pronunciadas no preço do combustível, comenta as novas medidas do governo para o setor e aponta os entraves e principais desafios para a expansão do etanol.
EXAME.com – O que justificou a forte alta dos preços do etanol nos últimos meses?
Marcos Jank – Primeiro, tivemos uma entressafra complicada, por conta de seca que atingiu o Centro-Sul em meados do ano passado. A quebra na produção foi da ordem de 10%, em torno de 50 a 60 milhões de toneladas de cana. Com as condições climáticas desfavoráveis, perdemos cerca de 5 bilhões de litros de etanol. Mas o consumo também estava muito acelerado no final de 2010 e pegou todo mundo de surpresa, tanto a venda de automóveis, como o setor de combustíveis. Agora, que estamos em plena safra, os preços do álcool vão começar a despencar com a oferta. Na semana passada, o preço já caiu mais de 30%.
EXAME.com – Esse período “complicado” deixa alguma lição para o setor?
Marcos Jank – A principal lição é que va mos ter que planejar e regular melhor as entressafras, evitando tanto as baixas muito pronunciadas do preço no auge da safra, como as altas que acontecem durante a entressafra. Portanto, temos que reduzir a volatilidade dos preços. Hoje, nós produzimos etanol durante 7 meses do ano, mas ele é consumido durante 12. E todo ano sempre surge uma certa insegurança em relação aos estoques para atravessar a entressafra. Temos que melhorar as condições de contratação de etanol, aproximando o etanol da gasolina. Os custos de produzir etanol aumentaram bastante de 2005 pra frente e o preço da gasolina está congelado de certa forma. E se quiser falar de crise, a verdadeira crise pela qual o setor passa é a de crescimento, de como crescer de forma sustentável e com uma certa dose de regulação.
EXAME.com – Como assim crise de crescimento?
Marcos Jank – Temos aí o desafio de voltar a crescer a uma taxa de 8% a 10% ao ano, no mesmo ritmo em que vínhamos entre 2000 e 2008, principalmen te voltados para o etanol. Em 2000, metade da safra era de etanol e a outra metade de açúcar. Em 2008, foi 60% etanol e 40% açúcar. De lá pra cá, houve uma desaceleração. Em 2008, a crise financeira atingiu duramente 1/3 do setor, que havia feito grandes investimentos desde 2005. Grupos que haviam construídos novas usinas foram severamente abalados.
A partir daí, os investimentos novos voltaram-se para a compra de empresas em dificuldades. Então, não houve expansão expressiva do setor e a indústria, que vinha crescendo 10% ao ano, passou a crescer só 3% ao ano nos últimos dois anos.