A democracia participativa é o principal instrumento da sociedade contemporânea para conjurar os riscos de alienação cívica e negação conservadora da política. As instituições representativas só têm a ganhar com o engajamento direto de indivíduos e grupos sociais na construção das políticas públicas. Quanto mais ativa a cidadania, maior será o nível de consciência e de corresponsabilidade social. E, no caso brasileiro, maiores também serão as chances de enfrentarmos e resolvermos alguns de nossos problemas crônicos, algumas das mazelas históricas do país.
É com essa convicção que o governo federal tem procurado fortalecer e ampliar os canais de participação da sociedade civil — conferências nacionais nas diversas áreas, conselhos em todos os ministérios, ouvidorias na administração direta e nas empresas estatais, mesas de negociação so! bre temas-chaves etc. — que já constituem o que poderíamos chamar de um sistema de democracia participativa no país.
Basta dizer que desde 2003 foram realizadas 60 conferências sobre as diversas políticas públicas, envolvendo diretamente cerca de 4,5 milhões de pessoas no Brasil inteiro. E, em 2009, além de duas já realizadas, ocorrerão outras 12, inclusive as de comunicação e educação, que despertam crescente interesse tanto nos meios populares quanto no empresariado e na intelectualidade.
Na verdade, o projeto de desenvolvimento em curso no país, que busca uma nova síntese entre o econômico e o social, o humano e o tecnológico, o produtivo e o solidário, exige outra relação do Estado com a sociedade, de parceria efetiva, capaz de mobilizar as melhores energias de cada segmento social em prol de objetivos nacionais compartilhados.
O Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar, lançado em Brasília, no último dia 25, é um ! dos mais concretos e inovadores resultados desse processo. Ele é fruto da Mesa de Diálogo tripartite — trabalhadores, empresários e governo — constituída em julho de 2008 pelo presidente Lula, sob a coordenação da Secretaria-Geral da Presidência da República.
Foram 17 reuniões de trabalho, ao longo de 11 meses. Os cortadores de cana tendo como porta-vozes a Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e a Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo (Feraesp). Os empresários do setor, representados pela União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo (Unica) e o Fórum Nacional Sucroenergético. E o governo, pela Secretaria-Geral da Presidência e outros seis ministérios: Casa Civil, Trabalho, Agricultura, Desenvolvimento Agrário, Educação e Desenvolvimento social. Todos empenhados em construir um entendimento inédito, apostando na negociação democrática e na busca de denominadores comuns.
A universalização das melhores práticas trabalhistas já existentes — tais como o recrutamento e contração direta de trabalhadores pelas empresas, eliminando o “intermediário”, principal motivo da precarização do trabalho; maior transparência na aferição da cana cortada manualmente; melhores condições de saúde e segurança do trabalho, com fornecimento gratuito de equipamentos de proteção individual; hidratação também gratuita e garantia de pausas ao longo da jornada; condições decentes de higiene pessoal; transporte melhor e mais seguro; alojamento adequado; acesso a meios de comunicação para migrantes, entre outros pontos de grande relevância para o cotidiano dos trabalhadores — possibilitará efetivo salto de qualidade nas condições e relações de trabalho do setor sucroalcooleiro, beneficiando diretamente cerca de 500 mil trabalhadores.
Mais de 300 usinas de um total de 413 unidades produtivas já aderiram voluntariamente ao Compromisso Nacional e adotarão práticas empresariais que ampliam os direitos sociais, trabalhistas e sindicais reconhecidos em lei.
O governo, por sua vez, compromete-se a adotar programas específicos para melhorar as condições de vida e trabalho dos canavieiros e, sobretudo, enfrentar o impacto da mecanização sobre o nível de emprego. Programas de combate ao analfabetismo e elevação da escolaridade e, ao mesmo tempo, de qualificação profissional, com vistas à recolocação no mercado de trabalho.
O Compromisso Nacional demonstra que é possível oferecer ao mercado interno e externo produtos competitivos e de qualidade e, ao mesmo tempo, assegurar novos direitos aos trabalhadores. Trata-se de um acordo histórico no país, de abrangência nacional e válido para o conjunto do setor sucroalcooleiro, cujo êxito poderá estimular experiências semelhantes em outros setores produtivos.