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Fila de até 120 dias para ter caminhão

O fôlego de setores do agronegócio como o sucroalcooleiro, o recorde da safra de grãos e a recuperação de atividades há até pouco tempo adormecidas, como a da construção civil, provocam filas para a compra de caminhões. A espera no segmento de pesados vai até 120 dias

Faltam meios para transportar a cana-de-açúcar, a produção das mineradoras, a grande quantidade de itens que continua a ser exportada, a despeito da valorização do real, e agora, justamente em conseqüência do câmbio favorável, a crescente chegada de produtos importados.

A falta de caminhões se concentra nos segmentos pesado e semipesado, que num único mês, em abril, registraram crescimentos de vendas entre 40% e 56% em comparação com o mesmo mês do ano passado. É esse tipo de veículo que as empresas que estão experimentando uma atividade mais intensa precisam.

As montadoras esperavam um crescimento e se ajustaram para atende-lo. Mas a demanda superou as previsões. Os fabricantes afirmam que se pudessem produzir mais, estariam vendendo mais. As duas maiores produtoras de caminhões pesados, Volvo e Scania, não têm encontrado outra saída a não ser pedir paciência ao cliente.

A Volvo está fechando hoje negócios de veículos que em determinadas cidades do país só poderão ser entregues entre o final de setembro e início de outubro. As regiões onde as filas estão mais longas são Paraná, Santa Catarina e São Paulo. Em outras partes do país, a espera é de 45 dias.

“Não víamos uma situação dessas desde 2004”, afirma o gerente de vendas de caminhões pesados da Volvo, Bernardo Fedalto. O ideal seria ampliar a produção na fábrica instalada em Curitiba (PR). Mas a montadora enfrenta um problema de abastecimento. Parte dos componentes da caixa de câmbio e do eixo traseiro dos seus veículos são importadas.

As peças vêm da Suécia, a matriz da companhia, que enfrenta também na Europa um aquecimento de demanda por conta, principalmente, do crescimento da atividade econômica do Leste Europeu.

Segundo Fedalto, há cerca de três meses, a direção mundial da Volvo decidiu investir na ampliação das linhas de componentes da Europa. Mas o aumento da produção requer tempo. Enquanto isso, quando a situação aperta a filial brasileira apela até para o transporte aéreo para trazer as peças que vêm da Suécia.

“Mas isso também não adianta muito porque as fábricas européias estão também no seu limite”, afirma Fedalto. O executivo conta que a fábrica da companhia na Holanda está trabalhando com filas de espera que vão até março do próximo ano.

O comprador de caminhões pesados já está acostumado a esperar. As características do produto fazem com que todos os fabricantes trabalhem apenas com encomendas. Mas o ritmo, numa situação normal, é outro.

Na Scania, a habitual espera de cinco a seis semanas pulou para 90 dias. A fábrica da montadora, em São Bernardo do Campo (SP), está projetada para uma capacidade de 20 mil veículos por ano. Nas contas do diretor geral da Scania, Christopher Podgorski, novos processos produtivos permitirão a unidade alcançar 23 mil este ano. A partir daí, será preciso acelerar estudos de investimento em ampliação.

A Scania conseguiu, de janeiro a abril, elevar as vendas internas em 31%. Mas dois terços da produção da montadora estão comprometidos com a exportação. A valorização do real não impediu que a Scania continuasse exportando quase 70% do que produz para países da América Latina e também do Leste Europeu, regiões em que todos os mercados de caminhões também estão aquecidos.

A Volkswagen Caminhões fechou um acordo com fornecedores de logística para encontrar uma maneira de liberar um pouco da área da fábrica, localizada em Resende (RJ). Esses parceiros construirão um centro logístico para onde serão deslocados componentes que hoje ocupam parte da área de produção.

“Com isso conseguiremos desafogar um pouco o espaço e garantir mais rapidez na linha de produção”, afirma o presidente da empresa, Roberto Cortes.

O executivo garante que a espera para a compra de veículos da montadora está dentro dos padrões normais, salvo casos de versões mais específicas. Mesmo assim, a empresa continua a acelerar o ritmo de produção.

A fábrica de Resende terminou 2006 com a média de produção de 150 veículos por dia, incluindo caminhões e ônibus. Já está em 165 e agora a direção da montadora alemã precisa definir a próxima meta, que oscilará entre 185 a 200 unidades, dependendo do comportamento das exportações. Com esse aumento, será preciso contratar mais.

Cortes conta com medidas governamentais para desonerar a exportação. Se isso acontecer, os índices de reajustes dos caminhões Volks exportados serão menores, o que pode acelerar ainda mais o ritmo da linha de montagem.

No primeiro quadrimestre, as vendas de caminhões no Brasil cresceram 19,8%. Isso provocou um aumento de produção de 18,4%. Os executivos do setor, que começaram o ano contando com um crescimento em torno de 10%, falam agora em percentuais entre 15% e 17%. Os fabricantes de pesados dizem que esse segmento terá este ano volumes até 22% maiores do que em 2006.

Todos prevêem que o ritmo da demanda continuará acelerado. “Eu não consigo ver queda de demanda até julho de 2008”, afirma Fedalto, da Volvo. O executivo aponta a safra de grãos, e a continuidade da atividade industrial. Para ele, o único risco é de a valorização do real começar a afetar o exportador de grãos.

Para Podgorski, da Scania, um ponto importante é o comércio exterior. “A movimentação de contêineres está uma coisa incrível”, afirma. “E nada do que está acontecendo parece uma bolha”, diz. Para ele, é possível até que novos fatores, como queda da taxa Selic, provoquem mais aquecimento.