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Combater mudanças climáticas é possível e barato, diz ONU

O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) daONU, no sumário para formuladores de política sobre como segurar o efeito estufa, mostra que a sociedade já temem mãos instrumentos possíveis para evitar os males maiores do aquecimento. Mas isso tem um custo: 3% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial até 2030, ou apenas 0,1% a 0,2% por ano, valor que pode ser menor do que os custos da adaptação às mudanças climáticas. Mas falta comprometimento político para implantá-los.

O texto foi divulgado ontem, em Bangcoc, após uma semana de negociação entre as delegações de países desenvolvidos, com Estados Unidos à frente, dos emergentes, conduzidos pela China, e os cientistas que de fato escreveram o relatório. Em comparação com o texto inicial, de segunda-feira, alguns termos sobre responsabilidade foram abrandados.

Ainda assim, as conclusões continuam fortes. De acordo com a concentração almejada de gases-estufa na atmosfera terrestre– e o conseqüente aumento na temperatura média global, com seus devidos impactosna biosfera– os governos precisarão decidir se gastam mais ou menos do PIB. Basicamente quanto menos se investir, maior a concentração de gases, mais alta a temperatura e mais agudos os impactos.

Leia-se por investimento uma série de medidas. O IPCC deixa claro que nenhum setor sozinho ou tecnologia única (inclusive soluções da geoengenharia, como guarda-chuvas espaciais gigantescos) pode atingir as metas de mitigação. Será necessário investir na mudança de matrizes energéticas: caia participação dos combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, sobe a das fontes renováveis, como nuclear, solar, calor e biocombustíveis. É preciso controlar o desmatamento – que, além de elevar o setor florestal ao terceiro lugar entre os que mais emitem, ainda impede a retirada do carbono do ar.

Deve-se modernizar usinas de energia, indústria, transporte, construção e agricultura para que poluam menos.

PORTFÓLIO DE SOLUÇÕES

É preciso, dizem os cientistas, investir em meios de transportes que consumam menos combustíveis, em métodos de controles de pragas agrícolas menos poluentes e em uma construção civil mais inteligente, que use melhora luz solar e seja menos dependente de sistemas de climatização.

Há a necessidade de redesenhar as plantas industriais para que demandem menos energia e emitam menos gases e implementar técnicas de manejo da terra responsáveis, combinadas ao reflorestamento e ao combate irrestrito ao desmatamento – que detém sozinho o poder de controlar 50% das emissões de CO2 doplaneta.

A criação de incentivos financeiros para manter a floresta em pé é aconselhada. Ela ecoa em propostas atuais de criação de um fundo para os países tropicais evitarem o desmatamento, entre elas uma brasileira.

É fundamental, diz o relatório, encontrar alternativas ao petróleo e aos demais combustíveis fósseis, responsáveis diretos pelo aquecimento global. OIPCC recomenda o investimento e a adoção de energias alternativas, citando os biocombustíveis – sem, no entanto, mencionar o etanol.

CONTRATO COM O FUTURO

A questão é justamente a escolha do cenário que a geração atual deixará para a próxima. Hoje a concentração de gases-estufa é de aproximadamente 430 partes por milhão (ppm)deCO2 equivalente (ou a quanto todos os tipos de gases que causam o problema correspondem, juntos, à quantidadede dióxido de carbono).

Um investimento de até 3% do PIB até 2030 manteria a concentraçãoem445ppm, o que provocaria um aumento de 2,4˚C a 2,8˚Cnatemperaturaglobal,em comparação à medida na época pré-Revolução Industrial. Seria suficiente para ameaçar a existênciade30% das espécies do planeta, contudo é um índice considerado manejável pelos cientistas.

O percentual do PIB varia de acordo com os cenários usados para criar projeções.

“Se mantivermos um crescimento mundial entre 3% e 5%, o custo das medidas mais ambiciosas para reduzir o aquecimento terão impacto de 0,1% a 0,2% do PIB mundial ao ano”, disse ontem, em Bangcoc, o climatologista alemão Bert Metz, um dos coordenadores do grupo de escreveu este sumário.

O IPCC não detalhou valores, pois não trabalha com projeções de crescimento do PIB até 2030. Em valores atuais, representaria entre US$ 46 bilhões e US$ 92 bilhões por ano, considerando o PIB mundial atual de US$ 46 trilhões. Mas, se nenhum investimento for feito para controlar as emissões de gases, em2030aconcentração deCO2 equivalente na atmosfera pode quase duplicar.“ O IPCC está oferecendo cenários que propõem idéias claras para escolhas políticas determinantes. Se continuarmos inertes, teremos grandes problemas”, disse Ogunlade Davidson, o segundo coordenador do grupo.

No caso de inação, o mundo estará, em 2090, frente ao aquecimento médio de até 4ºC – terrível entre as projeções para o futuro da Terra, com graves conseqüências como alteração de biomas, derretimento do gelo polar e mudanças extremadas no clima.