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Febre do álcool reduz estoque mundial de alimentos e já faz os preços subir

A alta dos preços agrícolas, impulsionados em parte pela demanda por combustíveis produzidos a partir de grãos, está encarecendo a alimentação no mundo e gerando uma nova fonte de pressão inflacionária.

O aumento do preço dos alimentos já está causando problemas em algumas partes do mundo — especialmente em países relativamente pobres como Índia e China. Se essa tendência se espalhar, pode contribuir para a diminuição do crescimento mundial, ao forçar as pessoas a gastar menos em outros itens ou incentivar os bancos centrais a combater a inflação aumentando os juros.

Os políticos de países onde o preço dos alimentos é uma questão particularmente sensível já começam a reagir à onda de alta, antes que ela cause problemas sociais ou mais dificuldades econômicas. Mas não está claro se essa reação será suficiente para conter as pressões atuais, ou se o que existe agora é so o começo de um período prolongado de inflação nos alimentos — parecido com a valorização recente do petróleo e de outras commodities.

Uma das principais causas da inflação nos alimentos é a demanda por etanol e biodiesel, que podem ser produzidos a partir de milho, óleo de palma, cana-de-açúcar e outras lavouras. A demanda aumentou o preço dessas commodities, levando a custos maiores para uma gama de produtores em setores que vão da agropecuária às granjas e fabricantes de refrigerantes.

Em alguns casos, os produtores estão repassando os custos para o consumidor final.

Vários anos de crescimento econômico no mundo também aumentaram o consumo de alimentos, contribuindo ainda mais para a pressão inflacionária.

A inflação dos alimentos está crescendo — em alguns lugares, de maneira aguda — na Índia, China, Europa e até em economias menores como Turquia, África do Sul e Polônia. Na Hungria, ela está em mais de 13% ao ano, comparada com menos de 3% em 2005.

Na China, o preço dos alimentos está subindo 6%, mais de três vezes o índice registrado três anos atrás. Os preços também subiram na Alemanha, Itália e Reino Unido. Eles podem até estar para subir no Japão, mas os sinais ainda são incertos, já que os preços gerais no país só agora estão começando a aumentar depois de um longo período de economia fraca.

Os Estados Unidos também estão sentindo alguns efeitos, com o custo dos alimentos tendo subido 3,1% em fevereiro ante um ano atrás — um ponto porcentual a mais do que em meados de 2005.

No Brasil, o item alimentação tem sido o que mais sobe entre os componentes do índice de preços ao consumidor da Fipe. O índice mais recente, de março, registrou alta de preços de 0,11% na cidade de São Paulo, sendo que os produtos alimentícios, ainda que em alta menor do que economistas previam, subiram 0,62%.

Se a tendência continuar sendo de alta, os consumidores podem pagar mais caro para tudo, do leite ao refrigerante, já que o milho é usado para alimentar os rebanhos e fazer xarope de milho, um ingrediente essencial para muitos refrigerantes.

Um porta-voz para o National Chicken Council, uma associação americana dos produtores de frango, disse a um comitê do Congresso americano que a população do país deve esperar pagar mais caro pelo frango por causa do que o grupo descrevia como a “crise do etanol”.

Nos EUA, o milho é a matéria-prima mais usada para fazer álcool combustível.

Previsões apocalípticas de um grande desabastecimento de alimentos na China e outros lugares têm circulado por anos, mas não se materializaram. E alguns economistas acreditam que o crescimento recente na demanda de grãos pode ser suprido sem provocar grandes problemas à economia mundial.

Eles acham que os preços podem voltar a cair com o tempo, especialmente se alguns países com mais terras aráveis disponíveis — em especial o Brasil — aumentarem sua produção.

Avanços tecnológicos, como variedades melhores de sementes, também podem ajudar a manter a produção alinhada com a demanda.

Ao mesmo tempo, preços mais altos para os produtos agrícolas não são ruins para todos. Eles ajudam a aumentar a renda no campo. Em alguns casos, a demanda crescente por alimentos também reflete a renda maior de populações mundiais que já foram pobres.

Até agora, a inflação mundial permanece relativamente baixa e estável. Mais ainda, os preços de alimentos são conhecidos pela sua volatilidade, e alguns desses aumentos decorrem de fatores que podem se reverter com o tempo.

Mas muitos economistas acreditam que as forças por trás da atual onda de inflação nos alimentos persistirão, ou ressurgirão nos anos vindouros.

— Lauren Etter, Conor Dougherty, Hanting Tang, Kersten Zhang e Binny Sabharwal colaboraram neste artigo.