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Produção da indústria está mais “pobre”, diz Iedi

Os empresários do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) receberam a perda de participação da indústria no Produto Interno Bruto (PIB), registrada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no novo cálculo do PIB, como uma notícia velha e ainda em curso. Para o Iedi, os dados corroboram a tese de que nos primeiros anos do Real (1995 a 1999), o câmbio apreciado afetou a indústria e, após um pequeno respiro, a desindustrialização do Brasil está novamente em curso. E ela tem a face do empobrecimento da produção doméstica.

Em café da manhã, ontem, o Iedi apresentou o estudo “Importações, câmbio e indústria: a marcha da desindustrialização no Brasil”. O trabalho recupera vários dados de estudos já divulgados e mostra que desde 1996 – com pequenos soluços – a produção da indústria brasileira está cada vez mais “pobre”, agregando menos valor local à manufatura de bens. Em 1996, de todo bem final produzido no Brasil, 47% era feito localmente. Até 2004 – último dado disponível – essa participação doméstica caiu quase continuamente e chegou a 42,5%. Para os empresários, essa perda de valor agregado da produção brasileira decorre do aumento das importações e está sendo influenciada fortemente pelo câmbio apreciado.

“Tudo indica que a descida da rampa prossegue”, diz o diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Francini. “O câmbio está expondo o Brasil a um desequilíbrio que pode se tornar muito grave”, acrescenta Josué Gomes da Silva, presidente do Iedi.

Os dados da perda de valor agregado fazem parte de um estudo da professora Carmem Feijó, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Para ela, a indústria brasileira mostra, muito precocemente, uma especialização focada em recursos naturais e a mudança que está em curso “é estrutural e é mais grave do que se imagina, justamente porque a participação da indústria no PIB é menor do que se imaginava”.

A perda de participação da indústria no PIB, observa Edgar Pereira, diretor-executivo do Iedi, segue o perfil de economias maduras, com alta renda per capita e não de países em desenvolvimento e de baixa renda média como é o caso do Brasil.

A Alemanha atingiu o auge de participação da indústria no PIB na década de 70, quando foi a 43%. Naquela oportunidade, a renda média era de US$ 17 mil. Desde então, a indústria alemã perdeu espaço para o setor de serviços, e hoje representa perto de 25% do PIB. Nos Estados Unidos, o movimento foi semelhante e depois de atingir uma participação de 35% na economia americana, a indústria responde hoje por 23%. Mas quando a queda começou, a renda era de US$ 22 mil e hoje está em US$ 35 mil.

“E o Brasil começou esse processo com uma renda que é um oitavo daquela que os americanos detinham quando a indústria começou a perder espaço no PIB”, argumenta Pereira, para justificar a avaliação de que o processo brasileiro é extremamente precoce. “E só estamos crescendo no que é básico, tradicional”, acrescenta.

A professora Carmem Feijó analisou a produção industrial de 2006 e concluiu que no ano passado, em relação a 2004, a indústria de transformação perdeu participação (menos 0,4%) no total do valor adicionado, enquanto a indústria extrativa ganhou terreno (os mesmos 0,4%). Entre os setores que contribuíram menos para a produção total (em valor) destacam-se metalurgia básica, madeira, vestuário e máquinas. Entre os que ganharam espaço na geração de valor da indústria estão máquinas para escritório e produção de veículos, setores com forte presença de componentes importados.

Um dos argumentos do Iedi para justificar a avaliação de que o processo de perda de valor agregado da produção local está em curso é o cruzamento dos dados de produção industrial e importações. Desde 2002, a indústria de alta tecnologia (que reúne a produção de celulares, eletroeletrônicos e computadores, entre outros segmentos) elevou sua produção em 35%, mas fez isso à custa de um aumento de 160% no seu déficit comercial, que passou de US$ 4,5 bilhões em 2002 para US$ 11,8 bilhões no ano passado.

O empresário Daniel Feffer, vice-presidente corporativo da Suzano Holding, que atua na área de papel e celulose, observa que o país está perdendo competitividade nas cadeias que agregam valor à produção. “No setor de papel e celulose, por exemplo, o resultado da parte extrativa do negócio, onde há muita competitividade, encobre a parcela referente ao papel, onde perdemos competitividade porque há muita conversão (de processos) e maior utilização de mão-de-obra, o que eleva nossos custos, explicou.

Gomes da Silva fez questão de esclarecer que o Iedi não é contra a indústria ancorada em commodities, como a do etanol, ou mesmo a da celulose. “Mas não podemos deixar de fazer o alerta de que a valorização do câmbio está levando a uma perda do valor da produção doméstica”, insistiu.

Para Francini, da Fiesp, é um erro avaliar que os dados recentes de aumento da produção de bens de capital indiquem um investimento crescente em modernização ou mesmo ampliação da produção. O aumento de 5,7% na produção de bens de capital registrada no ano passado pelo IBGE esconde, diz ele, uma queda de 1,3% na produção de máquinas e equipamentos. “O que puxa a produção são computadores e bens para energia e construção”, argumenta.

Para os empresários reunidos ontem pelo Iedi, a dupla juro alto-câmbio valorizado é a grande vilã do processo de desindustrialização do país. Além de defender uma moeda menos apreciada – a qual se poderia chegar com juros menores – eles também arrolam outras medidas, como maior eficiência do setor público, melhoria da infra-estrutura e, sempre, uma menor carga tributária. “Câmbio não é o único problema, mas é o de maior complexidade”, diz Francini.

Além do câmbio, diz Gomes da Silva, a produção brasileira também sobre a concorrência desleal de alguns setores da indústria chinesa. No setor têxtil, do qual ele é oriundo, 50% das importações chegam ao Brasil com preço abaixo do preço do algodão, cuja cotação é internacional. “Aí, nem câmbio resolve”, pondera