A avenida João Fiusa, na zona sul de Ribeirão Preto, principal pólo produtor de cana do mundo, virou o “point” dos novos ricos e dos já endinheirados da cidade. Boa parte dos lançamentos imobiliários de alto padrão está concentrado nessa extensa avenida arborizada.
Um novo lançamento ali, previsto para julho, será antecipado para o mês de abril para atender uma demanda “a toque de caixa”. É que alguns acionistas da Cia. Açucareira Vale do Rosário, de Morro Agudo (SP), já fizeram consultas sobre o empreendimento à incorporadora Habiarte Barc.
A demanda que surgiu de uma hora para outra é efeito da venda de 50,02% das ações da Cia. Açucareira Vale do Rosário, que liberou para o bolso de 72 pessoas a pequena fortuna de R$ 850 milhões. Desse público, cerca de 70% vive na região de Ribeirão Preto (ver quadro). Até o fim do mês, outros acionistas podem aderir à oferta feita pelos acionistas Cícero Junqueira Franco e Luís Biagi, o que elevaria o total da oferta a R$ 1,35 bilhão. O valor equivale a quase duas vezes o orçamento anual de Ribeirão. Fontes ouvidas pelo Valor afirmam que entre 80% e 90% desse dinheiro deverá ficar mesmo na cidade.
Não é à toa que o negócio virou o comentário em todas as rodinhas de Ribeirão. De motoristas de táxi a vendedoras de joalherias, passando por concessionárias de automóveis de luxo e corretores de imóveis, todos já ouviram falar da venda das ações da Usina Vale do Rosário. E, claro, querem saber onde esse dinheiro vai parar.
Na manhã de terça-feira, 27 de fevereiro, quando receberam o cheque da venda no escritório de advocacia Pinheiro Neto, em São Paulo, muitos desses acionistas tiveram de atender várias ligações em seus celulares de corretores de imóveis e de gerentes de bancos. O Bradesco, que concedeu o financiamento necessário à aquisição dessas ações, no mesmo dia montou um posto avançado para tentar captar aplicadores para seu private banking.
Pelo perfil dos acionistas, a expectativa é de que boa parte dos acionistas procure investimentos em imóveis. “Há também muita gente que tinha uma vida comum, sem luxo, e que agora vai querer atender a essa demanda reprimida, buscar produtos como apartamentos e carros de luxo”, diz fonte que participou das negociações.
O prédio na avenida João Fiusa é um exemplo. O empreendimento tem um apartamento por andar, com 448 metros quadrados de área útil, e está avaliado em R$ 1,4 milhão. O diretor da construtora Habiarte, Paulo Rivalta de Barros, diz que a antecipação do empreendimento não será apenas para atender aos acionistas da Vale do Rosário, mas que as recentes consultas desse público estimularam a construtora a lançar o prédio antes do previsto.
Na Piramid Imóveis, uma equipe de corretores deverá ser deslocada só para prospectar negócios para esses potenciais investidores, jura Antonio Peixoto, gerente da imobiliária.
As corretoras de valores instaladas na cidade também já foram procuradas. “Como os valores de investimentos são altos, encaminhamos esses acionistas para a matriz, em São Paulo”, diz um analista. “Muitos ficaram ricos do dia para a noite e não têm noção de como investir o dinheiro”, afirma.
Boa parte das concessionárias de luxo já foi procurada e há filas para compra de carros importados, inclusive Porsche. Na concessionária Toyota, controlada pelo Grupo Santa Emília, fundado em 1903 em Ribeirão Preto, há filas para carrões como Camery, caminhonetes Hilux e SW4, afirma Samuel Paiva Arantes Jr., supervisor de vendas do grupo. A Toyota tem sentido grande interesse dos agora ex-acionistas da Vale do Rosário. Os modelos mais badalados são Camery e Hilux e não saem por menos de R$ 150 mil. “Muitos usineiros pagam à vista”, diz Arantes.
Rui Flávio Chúfalo Guião, diretor-presidente do grupo Santa Emília, diz que a demanda por carros importados está aquecida, independentemente da venda das ações da Vale. “Vendemos mais nos meses de janeiro e fevereiro do que em dezembro [considerado o mês mais aquecido]”, afirma. Esse aquecimento deve-se ao bom momento do setor sucroalcooleiro, que vive um forte boom de investimentos, sobretudo por grupos estrangeiros interessados em álcool.
A cidade de Ribeirão Preto tem uma frota de 250 mil veículos e 24 concessionárias. “A proporção na cidade é de dois habitantes por veículo”, afirma Guião. “Se alguém compra um carro novo, todo mundo fica sabendo.”
Um giro rápido pela cidade mostra em que tipo de produto os acionistas da Vale do Rosário estão interessados. Constatou-se procura por carros e imóveis de luxo, mas não houve demanda por jóias, segundo levantamento do Valor nas principais joalherias da cidade. “Aqui ninguém veio gastar o dinheiro ainda. Mas se vier, ficaremos felizes”, diz uma funcionária da rede Casa Affonso, uma das mais tradicionais da cidade. A se julgar pelo perfil das pessoas que se desfizeram de suas ações, é bem possível que sobre uma “lasquinha” para o ouro. Quase metade é formada por mulheres, boa parte abaixo dos 50 anos .
Ribeirão Preto já é pólo de uma região considerada uma das mais ricas do país. Os 85 municípios da região representavam, na década de 70, 4,4% do PIB paulista. Atualmente, essa participação é de 7,8%, segundo o Instituto de Economia da Associação Comercial de Ribeirão Preto. Na década de 20, com o ciclo do café, a região chegou a responder por 19% do PIB paulista. “Com o novo boom do álcool, Ribeirão Preto poderá aumentar sua participação expressivamente”, disse o professor José Vicente Golfeto. Os acionistas da Vale do Rosário já estão dando sua contribuição.