A Petrobras iniciou sua participação no mercado internacional de gás natural liquefeito (GNL). A estatal anunciou investimentos de US$ 2 bilhões no projeto Mariscal Sucre de produção de gás na Venezuela. A proposta foi apresentada à estatal venezuelana PDVSA e há uma expectativa consolidada na diretoria da estatal brasileira de que o contrato entre as duas partes seja assinado até dezembro.
É um aporte bem diferenciado do planejamento estratégico anunciado pela Petrobras para os próximos cinco anos. A diretoria internacional da empresa comunicou que os maiores investimentos em exploração e produção (“os mais caros”, segundo o diretor da área, Nestor Cerveró) serão feitos nos EUA e África. A América do Sul (menos a Venezuela) deverá receber investimentos da Petrobras, entre 2006 e 2011, da ordem de US$ 2,8 bilhões, frente aos US$ 5,4 bilhões previstos para África e EUA. Outros US$ 3,9 bilhões deste planejamento estão destinados à compra de refinarias na Europa, Ásia e também nos EUA.
O plano de negócios anunciado revela mudança de rumo para os investimentos da Petrobras. O diretor Cerveró assegurou que a empresa passa a dar “maior atenção ao Golfo do México e à África do que à América do Sul”. Nos últimos cinco anos, o aporte externo na Petrobras concentrou-se na América do Sul, 44% do total no período. Para o próximo qüinqüênio os vizinhos sul-americanos ficam com apenas 23% dos aportes propostos.
O investimento no GNL venezuelano entrou neste planejamento estratégico já em execução. A decisão se justifica, segundo Cerveró, pela tendência de que o gás se torne “tão valorizado quanto o petróleo”. Vale notar que o mesmo projeto aberto para investimento da Petrobras foi negociado até o início de 2005 com a Shell, mas desde então as negociações foram repassadas para a Petrobras, por intermédio de convênios negociados por Brasília e Caracas.
Em fevereiro de 2005, os dois países assinaram vários acordos para desenvolverem projetos comuns na área petrolífera, petroquímica, mineração e infra-estrutura. Nesse momento, os esforços de negociação na área de energia foram apresentados como uma “união estratégica”. Em dezembro de 2005, os presidentes Lula e Hugo Chávez lançaram o projeto de construção de uma refinaria de óleo pesado em Suape, Pernambuco, construída em parceria entre a PDVSA e a Petrobras. Porém, este projeto não avançou como previsto.
De fato, nos últimos meses, Caracas abriu portas para o programa do álcool brasileiro, confirmando início de integração produtiva para janeiro de 2007. Há, inclusive, propostas já bem avançadas de colaboração venezuelana na produção de bioodiesel, com projetos sempre acoplados à PDVSA. Não há estimativas do volume de álcool e biodiesel a ser produzido em território venezuelano, mas a integração avançou até com a compra, pela estatal de Caracas, de duas usinas de álcool da Dedini (capacidade de 8,5 milhões de litros cada uma), negócio importante por ser a primeira usina comprada por petroleira. A previsão de entrega da primeira usina é junho de 2007.
No entanto, desde fevereiro deste ano a Venezuela adotou legislação bem mais rígida no que diz respeito ao controle do Estado sobre o setor de energia. Os contratos e joint-ventures assinados anteriormente foram reenquadrados para os novos termos da legislação, implicando sensíveis perdas para vários investidores, inclusive Petrobras.
Apesar da integração plena da Venezuela no Mercosul, apesar dos anúncios de projetos energéticos desde os campos venezuelanos de gás e óleo até centros consumidores na Argentina, é fato que há significativos componentes de insegurança para investimentos na Venezuela.
A Petrobras, uma companhia de capital aberto, deve justificar melhor a decisão de aportes tão grandes naquele país, depois das tensões enfrentadas pela estatal brasileira em Caracas. Se a decisão estava bem sustentada economicamente, o mercado também precisa saber. Por enquanto, há mais dúvidas do que informações concretas para este adendo, na direção do gás venezuelano, no plano de negócios qüinqüenal da Petrobras.