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A leve suspeita do ministro Mantega

No auditório do BNDES, no lançamento do “Pró-caminhoneiro” (incentivo para troca por veículos novos), no começo de junho, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, cobrou do presidente Lula: “Devemos lembrar que 1 de julho é dia de baixar a TJLP, hein?”. Lula preferiu responder no mesmo tom, brincando que iria auto-indicar-se para o Conselho Monetário Nacional (CMN) para “atender ao Furlan”. Porém, na véspera da reunião dos três integrantes do CMN, os ministros da Fazenda e do Planejamento, mais o presidente do Banco Central (BC), não há certeza de atendimento ao enfático pedido realizado em pleno BNDES.

A blague do ministro Furlan se justifica. Em dezembro, depois de uma imobilidade de 21 meses, o custo do dinheiro destinado à produção foi reduzido em 0,75%, alcançando 9% ao ano. Como esta taxa é avaliada trimestralmente, em abril o CMN a reduziu para 8,15%. Anteontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que tem uma “leve suspeita” de que haverá redução da TJLP, embora tenha ressalvado que sua condição de presidente do CMN o impede de dar declarações para não deixar seus pares “em situação constrangedora”.

O presidente do BNDES, Demian Fiocca, depois de reunir-se com Mantega, disse que continua acreditando que há espaço para que a TJLP caia para 7,5% ao ano, lembrando que a taxa é definida com base na meta de inflação, mais o risco-país, uma prévia garantia de que o recuo ocorreria. Porém, apesar de todo o otimismo, Fiocca também lembrou que o CMN tem seguido a regra de “maneira suave”.

Apesar das esperanças de Mantega e Fiocca, o debate no CMN não será tranqüilo. Na visão mais ortodoxa do BC, a TJLP não deve permanecer desvinculada demais da taxa de juro básica – a Selic. O argumento sustenta-se na eficácia da política econômica, que não poderia ter uma “torneira” tão aberta quanto estaria a do BNDES se a TJLP, nesta visão, caísse demais.

Apesar de todas as pressões, a velocidade de queda no custo do dinheiro para a produção não foi acelerada. Isto, mesmo quando o banco de fomento reconheceu, em fevereiro, que projetos e intenções de investimento existiam: há R$ 125 bilhões de iniciativas “em consulta” na carteira do banco. Não saem do papel, porque a TJLP é o que é. A base de cálculo na qual se apóia a TJLP permite redução mais acelerada. Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Associação Brasileira de Infra-estrutura e Indústria de Base (Abdib) tocou em ponto essencial: a redução da TJLP é pre-condição para desenvolvimento sustentável.

A CNI lembrou na nota que a produtividade da indústria está estagnada há cinco anos e precisa de “estímulo” para voltar a crescer. As simulações propostas pelas duas entidades mostram que há espaço técnico para redução de 1,25 ponto percentual na taxa, derrubando-a para 7%. Este cálculo, baseado na inflação projetada para 12 meses, não é essencialmente diferente do proposto por Fiocca, que fala em 7,5%.

Como o custo do dinheiro para a produção é tão alto, a reestruturação produtiva brasileira é produto da crescente importação de bens de capital. Investimentos têm sido feitos fora do Brasil, porque a taxa de câmbio transformou essa decisão em prioridade. Os cálculos preliminares do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) antecipam queda de 0,3% em abril na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), os investimentos, em relação a março.

Motivo: a produção nacional de bens de capital está estagnada e a produção de insumos da construção civil avançou apenas 0,6%, a metade do que cresceu em março. Construção civil é a atividade com maior peso na FBCF. E o Ipea mostrou que este setor despencou 2,4% em abril em relação ao mesmo mês de 2005. Já o CMN, por sua vez, não pode fazer de conta que estes dados não existem.

Sem investimento na produção não há crescimento sustentado. Porém, enquanto a TJLP aceitável for apenas “leve suspeita”, a decisão de investir fica para depois. Pior para o País.