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É a hora de estreitar as relações

À medida que se aproxima a comemoração do centenário da imigração japonesa no Brasil, que ocorrerá em junho de 2008, mais intensas vão se tornando as afirmações a respeito de uma nova uma etapa no relacionamento entre os dois países. Autoridades, dirigentes empresariais e personalidades de diferentes áreas de atividade no Brasil e no Japão falam com freqüência crescente sobre a complementaridade econômica entre esses países e das oportunidades que uma data histórica como o centenário da imigração cria para o estreitamento do intercâmbio. E isso pode ser feito não somente no terreno econômico, onde o campo parece mais fértil, mas também em áreas pouco exploradas, como a cultural.

Para dar um significado especial à data, os governos dos países decidiram transformar 2008 no Ano do Intercâmbio Brasil-Japão. Como preparativo para essa celebração, nos últimos dois anos, diversas missões oficiais do Brasil, lideradas por ministros e governadores, visitaram o Japão. Autoridades japonesas, entre elas ministros de Estado e parlamentares, igualmente estiveram no Brasil nesse período. As visitas do primeiro-ministro Junichiro Koizumi ao Brasil, em setembro de 2004, e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Japão, em maio de 2005, podem ser consideradas o símbolo desse novo relacionamento entre os dois países no terreno diplomático.

Há um novo tipo de relacionamento também no terreno econômico? “O ambiente é cada vez mais favorável” para isso, afirma o presidente da Mitsui Brasileira, Takao Omae, um dos maiores conhecedores da economia brasileira entre os executivos das grandes corporações japonesas. “Sou um entusiasta da economia brasileira”, diz. E, nessa condição, torce para que 2008 se torne, de fato, “o detonador do processo de revitalização do intercâmbio” entre Brasil e Japão. O Ano do Intercâmbio será também “uma excelente oportunidade para se refletir sobre a forma de um relacionamento sustentável” entre os dois países.

Omae acompanhou de perto as mudanças pelas quais passou o relacionamento entre os dois países. Do entusiasmo com que empresas japonesas investiram no Brasil na década de 70, passando pela crise da dívida externa dos países em desenvolvimento na década seguinte, e chegando à longa estagnação da economia japonesa nos anos 90, a tudo isso Omae assistiu, trabalhando no Brasil – esta é a 3ª vez que mora no País – ou em outras dependências da Mitsui. Hoje, ele identifica um “movimento positivo” em termos de investimentos japoneses (ver página ao lado). Vê também grandes possibilidades na área de transferência de tecnologia com a definição, pelo governo, do sistema de TV digital que o País adotará.

A própria Mitsui vem ampliando seus investimentos no Brasil. Além de atuar diretamente na área de comércio internacional, ela tem participações em muitas empresas, em atividades como distribuição de gás natural, operação e locação de equipamentos ferroviários, produção de fertilizantes, alumínio, fibra ótica e materiais para redes de comunicação. Suas aplicações no Brasil totalizam 210,6 bilhões de ienes, o equivalente a US$ 1,87 bilhão.

ETANOL

A aposta mais forte da Mitsui atualmente é nas exportações de etanol brasileiro para o Japão. Este é um tema ao qual a empresa vem se dedicando desde 2001, quando previu que, em decorrência do Protocolo de Kyoto, a demanda por etanol e biomassa cresceria exponencialmente no Japão. Alguns números sobre a demanda potencial do etanol pelo Japão impressionam. O país consome 60 milhões de quilolitros (kl) de gasolina por ano. Se à gasolina se adicionar 3% de etanol, como se espera que ocorra dentro de alguns anos, o consumo de etanol será de 1,8 milhão de kl por ano. No caso, não improvável, de se adicionar 10% de etanol à gasolina, o consumo alcançará 6 milhões de kl, ou um terço da produção brasileira atual.

Mas isso ainda está no terreno das possibilidades. Em sua passagem pelo Brasil, no mês passado, o ministro japonês de Agricultura, Silvicultura e Pesca, Shoichi Nakagawa, afirmou que a exportação em larga escala de etanol brasileiro para o Japão ainda não foi decidido em nível governamental.

INTERESSE

No meio empresarial japonês, a presença ativa da Mitsui na economia brasileira está simbolizada no fato de o presidente mundial da empresa, Shoei Utsuda, ser também o presidente Comissão de Cooperação Econômica Brasil-Japão da Keidanren, correspondente nipônica da brasileira Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Na busca de um ambiente mais favorável para o intercâmbio, a Keidanren e a CNI estão procurando estabelecer acordos de parceria econômica (EPA, de Economic Partnership Agreements), que os japoneses consideram mais amplos que os tradicionais acordos de livre comércio, pois, além de trocas comerciais, os EPAs tratam de investimentos, cooperação nas áreas de proteção ambiental, tecnologia e turismo, além de programas de intercâmbio cultural. O Japão tem ou negocia EPAs com o México e alguns países da Ásia. O problema é que este é um mecanismo ainda praticamente desconhecido pelo governo brasileiro, o que pode dificultar sua implementação no curto prazo.

Outro problema que Omae vê para o estreitamento das relações entre Brasil e Japão nos diferentes campos de atividade humana é a falta de uma estrutura, de um sistema institucional que facilite as coisas e assegure que os dois lados obtenham vantagens.

É preciso criar essa estrutura e “este é o momento para avançarmos nessa direção”, diz o presidente Mitsui Brasileira.