Mercado

Países pobres temem mudança na política do açúcar na OMC

Ao sol do meio-dia, nas plantações de açúcar de Triolet, no norte de Maurício, trabalhadores com chapéu de palha e botas de borracha empunham seus facões, cortando a cana de açúcar.

Lakshami Chummun, 62 anos, é uma das milhares em Maurício que trabalham duro nas plantações de açúcar durante os seis meses da colheita, cortando cana que será transformada em açúcar não refinado e enviado para Europa.

“O trabalho é difícil, mas não tenho escolha, pois meu marido morreu em um acidente e eu não posso trabalhar em outra coisa, se não cortando cana”, diz Lakshami.

“Se não tiver mais açúcar, não sei o que fazer pois estou muito velha para ser treinada para outro trabalho.”

Lakshami e centenas de milhares de trabalhadores nas lavouras de açúcar em Maurício e outras ex-colônias européias estão ameaçados de perder sua subsistência com a maciça reforma da política de açúcar planejada pela União Européia (UE).

Os ministros da UE estão discutindo propostas de cortar subsídios para o açúcar exportado da África, do Caribe e de países do Pacífico, reunidos na sigla ACP.

A iniciativa é resultado da decisão da Organização Mundial do Comércio (OMC), que considerou que os preços acima do mercado pago a produtores de açúcar europeus – e aos de ex-colônias que têm acesso especial aos mercados da UE – constituem comércio injusto.

Terremoto social

Para 18 países desse grupo de 79, incluindo Maurício, Suazilândia, Fiji, Moçambique, Barbados e Quênia, suas economias em desenvolvimento estão mal preparadas para suportar os cortes.

“Queremos uma reforma que é justa e não uma reforma que terá efeito violento sobre nossas economias”, diz Arvin Boolell, ministro da Agricultura de Maurício e porta-voz dos países produtores da ACP.

“O efeito do corte de preços vai ser tão devastador que estamos falando de pobreza maciça e terremoto social.”

Ele argumenta que muitos dos países da ACP são importadores líquidos de alimentos e não terão condições de obter matérias-primas e remédios se as reformas forem implementadas.

De acordo com o Protocolo do Açúcar, assinado com a UE em 1975, os países da ACP se beneficiam de isenções de impostos que permitem que eles exportem 1,3 milhão de toneladas de açúcar não processado por ano, a preço fixo, para a UE.

A minúscula ilha de Maurício no Oceano Índico participa com mais de 25% do total das exportações dos países da ACP para a União Européia e a cultura da cana gera 4% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

Desde que foi introduzido pelos holandeses há quase 400 anos, o açúcar se tornou a única commodity da ilha e uma das suas principais fontes de receita – no ano passado gerou US$ 332 milhões (R$ 743 milhões).

Segundo as autoridades do país, as receitas das exportações de açúcar para a UE permitiram que Maurício – ex-colônia francesa e britânica – diversificasse sua economia, desenvolvendo outros setores como turismo, serviços financeiros e produtos têxteis. Como resultado, o país tem um dos melhores desempenhos econômicos da África.

“Na Europa, eles estão eliminando as dívidas dos países muito pobres e muito endividados, mas aqui temos um país como Maurício que se esforçou para chegar a um nível de país de renda média”, diz o primeiro-ministro de Maurício, Navin Ramgoolam.

“Nunca saímos por aí com o pires na mão, dizendo nos dêem isso ou aquilo, e agora estamos sendo penalizados por nossos esforços.”

Efeitos

Os especialistas estimam que cerca de 300 mil pessoas são empregadas diretamente na produção de açúcar nos países da ACP.

Representantes do setor dizem que se forem incluídas as famílias dos trabalhadores, os cortes propostos podem afetar milhões de pessoas.

Segundo eles, isso pode levar a uma perda de receita de US$ 310 milhões (R$ 694 milhões).

Os países da ACP dizem que a reforma pode inviabilizar os esforços dos países de alcançar as Metas de Desenvolvimento do Milênio da ONU, acabar com cooperativas de pequenos poupadores e bancos de agricultores locais, provocar desemprego maciço e aumento da pobreza e da criminalidade.

Por isso, eles querem um corte menor do subsídio nos próximos oito anos e muito mais do que os 40 milhões de euros (R$ 106 milhões), que estão sendo oferecidos pela UE como compensação.