O difícil relacionamento com a indústria processadora de laranja desencadeou um processo de migração entre os produtores do interior de São Paulo. Atraídos por ofertas mais suculentas das usinas, quase 900 citricultores trocaram o cultivo da fruta pelo da cana-de-açúcar. Outro fator que engrossa o movimento são os riscos menores de doenças que podem dizimar plantações.
Segundo Paulo Castilho, diretor agrícola da Usina Santa Elisa, de Sertãozinho, as usinas de açúcar e álcool dão mais apoio ao produtor e fomentam a produção da matéria-prima. “Antes, os lucros por hectare de laranjais plantados eram maiores”, diz. “Hoje, as indústrias não têm interesse no produtor”.
O consultor em cana-de-açúcar a álcool André Marques Válio tem a mesma opinião: “Os contratos firmados beneficiam apenas as processadoras.” Atualmente, o mercado é concentrado em quatro indústrias de processamento de laranja, que detêm 95% do total da produção. Por isso, o poder de fogo dos produtores é muito limitado.
Estado responde por 85% da produção de cana
Embora não seja um “negócio da China”, o setor de cana tem 140 indústrias e 11 mil produtores distribuídos entre norte e oeste do Estado. É um contingente que produz 85% do total nacional, o equivalente a 330 milhões de toneladas em 2004. A previsão para 2005 é que esse volume chegue a 354 milhões.
O quesito preço também é apontado como uma diferencial para a troca de negócio. De acordo com a União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo (Unica), o cultivo de cana é um dos mais rentáveis, pois o preço do Açúcar Total Recuperável (ATR) contido na cana é de R$ 0,2414 por quilo, ou R$ 24,14 a tonelada. Esse valor é definido mensalmente pelo Consecana, órgão que define os preços da ATR no Brasil. O preço, conforme a Única, aumenta a cada nova regulamentação.
Para se ter idéia, uma caixa de laranja, com 40,8 quilos, custa US$ 3,60. Utilizando a cotação da moeda americana de 7 de outubro, uma tonelada custaria, então, cerca de R$ 39,25.
Embora seja mais rentável que a laranja, a cana também tem proporcionado lucros menores de 2002 para cá. Há três anos, o custo da produção de açúcar era de R$ 20 por tonelada, enquanto o canavieiro recebia R$ 27 por tonelada. Hoje, essa proporção é de R$ 31 para R$ 35.
Apesar do cenário, Manoel Carlos de Azevedo Ortolam, presidente da Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (Orplana), ressalta que as perspectivas são boas para o agricultor que planeja migrar para o cultivo. “Um dos grandes responsáveis por isso é a China, que em 2001 consumiu 6 milhões de toneladas e em 2005 deverá utilizar 13 milhões”, explica.
Segundo Ortolam, 40% do açúcar comercializado no mercado livre mundial vem do Brasil, cujo consumo interno é de 17 milhões de toneladas de açúcar por ano. A queda do preço do dólar não prejudica essa cultura, pois a tonelada de açúcar branco custa, atualmente, cerca de US$ 300 no mercado londrino.
Para o especialista Válio, não existe grande variação em relação ao período em que o dólar estava cotado a R$ 3 e o setor de cana está excessivamente otimista. “As próximas três safras, no mínimo, não terão problemas com preço ou falta de compradores”, garante.
Para se ter uma idéia do crescimento desse mercado, é importante salientar que, mesmo com o aumento de produtores, cerca de 75% da cana utilizada no beneficiamento é plantada pela própria usina. No caso específico da Usina Santa Elisa, a porcentagem é reduzida para 50%.
O aumento do uso de álcool no mercado interno e no exterior é apontado como a principal causa da expansão da área plantada de cana-de-açúcar no interior paulista Na Usina Santa Elisa, por exemplo, 60% da produção é de açúcar, enquanto 40% é de álcool. A demanda, porém, é maior para o combustível.
Carro bicombustível acelera vendas internas
No que se refere ao mercado externo, em 2003, o Brasil exportou 580 mil metros cúbicos de álcool. Em 2004, foram 1,9 milhão e, este ano, esse número deverá chegar a 2,2 milhões de metros cúbicos. No mercado doméstico, o aumento no consumo deve-se, principalmente, ao aumento da venda de carros bicombustíveis.
Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), até o último mês as vendas desses veículos totalizaram 562,717 mil unidades, enquanto os carros à gasolina vendidos chegaram a 544,106 mil.