Mercado

Nova safra garante abastecimento

Motoristas, fabricantes de carros a álcool e governo não enfrentarão problema com o suprimento do combustível em 2004. O clima mais seco que o normal ao longo da maior parte de 2003 nas principais regiões produtoras de São Paulo não impedirá que a próxima safra brasileira de cana-de-açúcar, a 2004/2005, supere a marca da temporada 2002/2003, batendo recorde de produção pelo terceiro ano consecutivo. Estimativas apontam para um crescimento de 5% a 10% na produção nacional, o que levaria a uma colheita de 368 milhões a 385 milhões de toneladas

Por outro lado, a confirmação de uma grande safra de cana vai aumentar a oferta de açúcar e álcool, que voltou a acumular estoques expressivos – hoje um pouco acima de 1 bilhão de litros – pressionando negativamente os preços desses produtos. As grandes safras de 2003 e 2004 resultam do incremento na área plantada a partir de 2000, quando a seca derrubou em 16% a produção nacional de cana e puxou para cima as cotações.

No setor, não mais se questiona se o excesso de oferta será mantido na safra 2004/2005, que começa a ser colhida em maio. “Os excedentes existem. O que se discute é a possibilidade de que ele se agrave, a depender do tamanho da nova safra”, diz Júlio Maria Martins Borges, da Job Economia e Planejamento.

Para evitar que os estoques de álcool aumentem ainda mais, o setor sucroalcooleiro avalia as opções de reter parte da cana no campo e atrasar o início da colheita. Porém, como reconhece Antonio de Padua Rodrigues, diretor técnico da Unica (União da Agroindústria Canavieira), reter a cana não é algo simples. O sucesso de uma medida como essa exige um acordo entre todos os produtores. E ninguém vai querer segurar a cana na terra se as cotações do açúcar e do álcool forem atraentes durante a safra.

Entre analistas e dirigentes das usinas, é consensual a necessidade de implementar uma estratégia agressiva nas exportações de álcool para enxugar a oferta generosa de matéria-prima, dada a manutenção do quadro de estagnação no mercado de açúcar. Em 2003, por exemplo, a exportação de açúcar declinou 3,4%, para 12,9 milhões de toneladas, enquanto a colheita da cana cresceu 10,9% na safra 2003/2004.

Segundo Rodrigues, poderá haver algum aumento de consumo de açúcar nas indústrias de doces, sorvetes e refrigerantes, se confirmada a recuperação da economia brasileira. Mas esse eventual incremento não seria significativo, segundo Rodrigues, pois o consumo anual per capita do Brasil é um dos maiores do mundo – 52 quilos – com pouca margem de expansão.

Na arena externa, também não se vislumbra a curto prazo demanda adicional para o açúcar. Do consumo mundial de 137 milhões de toneladas, de acordo com o número da Organização Mundial do Açúcar para 2002, apenas 35 milhões a 40 milhões são comprados no mercado livre, sem barreiras protecionistas.

Portanto, é possível que a participação do álcool avance na produção de derivados da cana na safra 2004/05. As esperanças das usinas estão depositadas na expansão das vendas do automóvel bicombustível e na ampliação das exportações. Para Rodrigues, não é exagero pensar que as vendas de álcool ao exterior pulem dos 757 milhões de litros registrados em 2003, para 1 bilhão de litros.

Para sustentar o ambicioso plano de conquistar mercados asiáticos, a Coimex Trading e a Unica fecharam contrato de três anos, que vence em abril de 2005, para a estocagem nas usinas de 700 milhões de litros. “É um estoque-pulmão para assegurar suprimento rápido e em grandes quantidades”, diz Clayton Miranda, vice-presidente executivo da Coimex Trading. Segundo ele, este ano o governo japonês vai realizar testes com carros movidos por mistura de 3% de álcool na gasolina. Preocupado com a poluição e a emissão de gases do efeito estufa, o Japão aguarda a entrada em vigor do Protocolo de Kyoto para decidir sobre o uso obrigatório do álcool.