Mercado

A grande promessa do agronegócio

O cenário está pronto para o Brasil colher a maior safra agrícola de todos os tempos. Como costumam dizer os homens do campo, “chove nas cabeceiras”, o que significa na medida certa, fora problemas localizados que não afetarão o resultado global. Se as condições climáticas continuarem favoráveis nos próximos 40 dias, a colheita atingirá 130 milhões de toneladas, volume 5,5% maior do que o recorde da safra anterior.

Mas é bom ter em mente que na atividade agropecuária clima não é tudo, embora seja fundamental. E a partir daí refletir sobre os fatores que permitiram ao Brasil, praticamente no curto espaço de uma geração, transformar-se numa potência agrícola, líder mundial na produção e exportação de vários produtos, além dos tradicionais café e açúcar de cana.

É indiscutível que o esforço empreendido no campo da pesquisa genética e da tecnologia foi fator primordial, ao possibilitar a ocupação das vastas regiões de cerrado e sua incorporação a uma atividade agrícola em bases empresariais e tecnificadas. Instituições nacionais de pesquisa – como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e institutos universitários – conquistaram respeito mundial por sua competência e eficiência científica. O trabalho dessas instituições permitiu notáveis ganhos de produtividade, tanto na produção agrícola quanto na de carnes bovina, suína e de aves. É graças a esse salto qualitativo que o Brasil detém, hoje, a melhor e mais eficiente agricultura tropical do planeta.

Essa condição, aliada a circunstâncias favoráveis do mercado internacional, que podem se repetir neste ano, permitiu ao setor do agronegócio uma excepcional performance em 2003. O setor foi a “salvação da lavoura”, ou seja, da economia nacional, ao exportar produtos no valor de US$ 30,6 bilhões, ante US$ 24,8 bilhões em 2002. Com importações de US$ 4,7 bilhões (US$ 4,4 bilhões em 2002), o superávit da balança comercial do agronegócio bateu em US$ 25,8 bilhões, em comparação com US$ 20,3 bilhões no ano anterior. Vale dizer que todo o superávit da balança comercial brasileira foi ancorado pelo agronegócio.

As exportações do complexo soja (grão, farelo e óleo), que foram de US$ 6,0 bilhões em 2002, aumentaram para US$ 8,1 bilhões no ano passado. A tendência é que as vendas externas de soja superem os números de 2003, tanto em volume quanto em valor. Isso porque as estimativas mais recentes apontam para uma redução da safra norte-americana do grão.

Com essa quebra, a produção estimada será inferior à demanda, o que provocará, como já vem ocorrendo, elevação do preço no mercado internacional. A maior pressão compradora virá da China, o maior mercado para a soja brasileira, que importou 7 milhões de toneladas em 2003.

Dos 20 milhões de toneladas que esse país importou no ano passado, 10 milhões foram comprados dos Estados Unidos e 3 milhões da Argentina. Como a produção agrícola chinesa também não atingirá os volumes previstos, e os Estados Unidos provavelmente não terão condições de fornecer o mesmo volume, a solução será ampliar as compras no Brasil e Argentina.

As perspectivas do mercado internacional também são extremamente favoráveis ao Brasil, no que diz respeito ao complexo carne (bovina, suína e de frango). O surgimento da doença da “vaca louca” nos Estados Unidos valorizou o “boi verde” brasileiro e abriu espaço para a abertura de novos mercados.

Nenhum país, como o Brasil, conta com uma disponibilidade tão descomunal de terras agricultáveis a serem exploradas. Segundo os últimos dados disponíveis, divulgados no início do ano passado, a agricultura ocupa uma área de 51 milhões de hectares. Outros 220 milhões de hectares correspondem a pastagens naturais e cultivadas. Ressalte-se que vastas áreas de solos pobres – entre as quais o arenito caiuá, no Paraná –, tradicionalmente ocupadas pela pecuária extensiva, já vêm sendo utilizadas para o plantio de grãos, também em conseqüência das novas tecnologias. O encolhimento das pastagens é um indicador de que a pecuária ganha produtividade, ou seja, criam-se mais cabeças por hectare.

Restariam, ainda, mais 90 milhões de hectares, sem se ocupar um só dos 350 milhões de hectares da floresta amazônica, segundo afirma o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Roberto Rodrigues. Mas não é bem assim, como mostra a reportagem sobre a fronteira agrícola do oeste do Pará que este jornal publica hoje. A pressão sobre a floresta amazônica precisa ser contida enquanto é tempo, sem prejuízo para a expansão da produção agrícola, e isso só será possível com um correto ordenamento, pelo governo, da ocupação de terras na região.