O RenovaBbio elevará os preços dos combustíveis no Brasil?
Antes de responder a pergunta do título deste artigo, vale referenciar o que é o RenovaBio e em qual contexto ele foi criado.
Acompanhe.
O Acordo de Paris e o Renovabio
O Acordo de Paris reúne o compromisso voluntário de diversos países perante a Organização das Nações Unidas (ONU), na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, sigla em inglês), ocorrida na sua 21ª Conferência das Partes (COP 21), em dezembro de 2015.
É um esforço conjunto para a redução das emissões dos gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, bem como para lidar com os impactos decorrentes das mudanças climáticas no globo terrestre.
O Brasil é signatário desse Acordo desde setembro de 2016, quando o país se comprometeu em reduzir as emissões dos GEE em 37% abaixo dos níveis de 2005 até 2025, podendo chegar esta redução a 43% em 2030 (MMA, 2018).
Dentre as várias iniciativas que compõem o ambicioso programa brasileiro para redução das emissões de carbono, como a redução do desmatamento e o reflorestamento em diversas áreas, por exemplo, está previsto o aumento do uso de biocombustíveis na matriz energética brasileira, para aproximadamente 18% até 2030, com foco no aumento da oferta de etanol e da parcela de biodiesel na mistura do diesel (MMA, 2016). As premissas adotadas pelo governo brasileiro em relação aos biocombustíveis foram:
– Biodiesel B7 em 2025 e B10 em 2030 (obs.: esta meta foi atingida antecipadamente em março de 2018, quando a obrigatoriedade do B10 passou a vigorar no país).
– Produção anual de etanol em 2025: 45 bilhões de litros
– Produção anual de etanol em 2030: 54 bilhões de litros
A aposta do Brasil nos biocombustíveis não é uma novidade, já que o país é um dos pioneiros em combustíveis renováveis, utilizando etanol oriundo da fermentação da cana desde a década de 1970, quando da criação do Proálcool (SILVA, 2008).
Já o uso de biodiesel é mais recente, cuja obrigatoriedade legal de mistura ao diesel petroquímico data de janeiro de 2008 (GAUTO, 2015), quando fora instituído o B2 (mistura de 2% de biodiesel com 98% de diesel fóssil).
Para cumprir o compromisso determinado pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris, o Governo Federal, junto ao Ministério de Minas e Energia e à Agência Nacional do Petróleo (ANP), instituiu a Lei 13.576/2107 e criou o RenovaBio, um programa de Estado que auxiliará na expansão dos biocombustíveis na matriz energética e que visa assegurar previsibilidade para o mercado de combustíveis.
O programa já tem as primeiras metas nacionais estabelecidas para redução das emissões para a matriz de combustíveis, definidas para o decênio 2019-2029 (figura 1).
Para 2019, a meta de descarbonização é de 1%, com percentuais crescentes até 2029, quando a redução será de 11%.
A meta representa uma redução de 11% em relação ao valor de referência divulgado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) de 74,25 gCO2eq/MJ que corresponde à intensidade de carbono média da matriz nacional de combustíveis em 2017.
Desta forma é esperado que ao final do decênio a intensidade de carbono caia para 66,1 gCO2eq/MJ. A ideia é que as metas sejam anualmente revistas, de acordo com o avanço do programa.
Figura 1 – Metas de descarbonização previstas em 2019 para o Renovabio
As metas nacionais do RenovaBio foram desdobradas em metas individuais para os distribuidores de combustíveis, conforme sua participação no mercado de combustíveis fósseis.
Em resumo, quanto maior for a venda de combustíveis fósseis pela distribuidora, maior será sua meta de descarbonização e maior a necessidade de adquirir CBIOs.
Para a redução de 1 tonelada de CO2 equivalente, será necessário adquirir um CBIO no mercado.
As metas para os três maiores distribuidores de combustíveis em 2019 são apresentadas no quadro 1.
Quadro 1 – Metas individuais compulsórias 2019 Renovabio, maiores distribuidoras
Fonte: elaboração própria a partir de dados da ANP, 2019
E de onde virão os CBIOs?
Dos produtores de biocombustíveis
Os produtores de biocombustíveis serão avaliados e certificados, por instituições independentes, com validação da ANP, em relação a contribuição individual que cada agente produtor tem para mitigação de uma quantidade específica de GEE em relação ao seu substituto fóssil (em termos de toneladas equivalentes de CO2 – tCO2e).
O CBIO será um ativo financeiro a ser negociado na bolsa (inicialmente na B3), emitido pelo produtor de biocombustível a partir da comercialização (nota fiscal) junto as distribuidoras, que cumprirão a meta ao demonstrar a propriedade dos CBIOs em sua carteira.
Um esquema a respeito de como está estruturado o RenovaBio é apresentado na figura 2.
Figura 2 – Esquema de funcionamento do Renovabio
Fonte: MME, 2017
Ao longo de 2018, a ANP trabalhou no arcabouço regulatório do programa e iniciou o credenciamento das empresas interessadas em serem as inspetoras dos produtores e importadores de biocombustíveis.
Essas inspetoras terão a responsabilidade de emitirem os certificados de produção eficiente de biocombustíveis e a nota de eficiência energético-ambiental, a partir da qual os produtores e importadores poderão solicitar os créditos de descarbonização (CBIO).
Até novembro de 2019, a ANP havia certificado 10 empresas inspetoras, que analisavam dezenas de pedidos de produtores para emissão de CBIOs.
Contudo, até aquela mesma data, A ANP havia homologado somente 5 empresas a emitirem os créditos de descarbonização.
O preço dos CBIOs
As estimativas variam muito.
Cada CBIO poderá valer de R$ 40 a R$ 150, dependendo da oferta e da volatilidade esperada para os papéis, segundo informações do MME.
Com poucas empresas credenciadas a venderem os CBIOS no mercado, sendo que nem todas devem ofertar os certificados num primeiro momento, é esperado que o valor inicial seja alto.
Pelos dados apresentados no Quadro 1, a BR Distribuidora, por exemplo, teve uma meta anual estipulada de 4,79 milhões de CBIOs, cujo valor total estimado variaria R$ 190 e R$ 720 milhões.
O momento é de muita incerteza em relação aos valores a serem desembolsados por cada distribuidora ao longo de 2020.
O impacto no preço dos combustíveis
Respondendo à pergunta original deste artigo, é esperado que as distribuidoras repassem o custo de aquisição dos CBIOs aos combustíveis comercializados.
Para a meta de redução de 1%, projetada em base anual, o repasse estimado seria de 1 a 3 centavos por litro de gasolina e diesel.
Se a meta de 11% de redução de emissões estivesse em vigor hoje, o impacto estimado seria de 10 a 30 centavos por litrode gasolina e diesel, a depender do preço do CBIO, considerando o volume de combustíveis fósseis comercializados em 2018 e que o repasse seria linear nos combustíveis considerados.
Vale lembrar que, quanto mais biocombustíveis as distribuidoras comercializarem, menor será a necessidade de compra de CBIOs. A ver o que vai ocorrer em 2020.
*Químico Industrial, especialista em Petróleo, Gás e Energia
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