Bactérias são normalmente associadas a organismos do mal, capazes de provocar doenças em seres humanos e destruir lavouras. Mas nem todas são assim. Algumas podem até mesmo ser benéficas, pelo menos para determinados cultivos agrícolas. É o caso da Gluconacetobacter diazotrophicus, não por acaso chamada de bactéria do bem por aqueles que a conhecem melhor: os cientistas da Embrapa, que acabam de seqüenciar o seu genoma.
Os especialistas já sabiam que essa bactéria presente na cana-de-açúcar, na batata doce e no abacaxi é essencial para o crescimento vegetal porque tem papel fundamental num processo conhecido como fixação de nitrogênio, em que o elemento é retirado da atmosfera e transferido para as plantas. Além disso, a bactéria é responsável pela produção de hormônios vegetais e promove um aumento do sistema radicular (das raízes), ampliando a absorção de nutrientes do solo.
Conhecer o genoma dessa bactéria, explicam, é uma forma de aumentar ainda mais o seu potencial e, com isso, ampliar a produtividade do cultivo de cana-de-açúcar (o estudo foi voltado especificamente para esse cultivo).
Naturalmente, a gluconacetobacter e outras duas “bactérias do bem”, presentes também na cana-de-açúcar, são responsáveis pela fixação de 40% do nitrogênio de que a planta necessita para o seu desenvolvimento.
— O restante vem do solo, de matéria orgânica e de fertilizantes contendo o elemento — explica José Ivo Baldani, da Embrapa Agrobiologia, um dos coordenadores do estudo.
Processo não oferece risco ambiental, garante cientista
Com o conhecimento mais profundo da bactéria, Baldani espera ampliar a capacidade de fixação biológica de nitrogênio de 20% a 30%. Isso traria uma economia de até R$500 milhões ao país por conta da redução do uso de fertilizantes e do aumento da produtividade.
De acordo com o presidente da Embrapa, José Geraldo Eugênio, espera-se uma diminuição de pelo menos 15% no uso de fertilizante.
— O Rio de Janeiro não é um grande produtor de cana, responde apenas por de 1,5% a 2% da área plantada do país. Mas, ainda assim, poderia ter um ganho de R$15 milhões a R$20 milhões — sustenta Baldani. — Há um outro ganho adicional pelo fato de se tratar de uma tecnologia limpa.
Para tornar a bactéria do bem ainda mais benéfica, os cientistas planejam provocar mutações genéticas específicas em um organismo e reproduzí-las em cultura. As bactérias mutantes seriam então inoculadas nas mudas das plantas antes de elas serem transplantadas para o solo.
Segundo o pesquisador, não há impacto ambiental no processo, uma vez que a bactéria é totalmente dependente da planta e não se espalha para o meio ambiente.
O cientista acredita que um produto inoculante feito à base da bactéria modificada pode já estar disponível no mercado dentro de cinco anos. O projeto RioGene foi desenvolvido em parceria com a Universidade Federal Rural e a Universidade Norte Fluminense, entre outras instituições. O custo da pesquisa é de R$4,8 milhões — R$3,4 milhões da Faperj e R$1,4 milhão do MCT/CNPq.
Uma outra bactéria benéfica, a Herbaspirillum seropedicae, também isolada pelos especialistas da Embrapa em Seropédica, está em fase final de seqüenciamento genômico por um grupo de cientistas da Universidade Federal do Paraná. Essa bactéria, também uma fixadora biológica de nitrogênio, está presente na cana-de-açúcar e em outras plantas.