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Amazônia vira vilã das mudanças climáticas

De pulmão do mundo a uma vilã do aquecimento global. As crescentes queimadas na Floresta Amazônica estão colocando o Brasil entre os dez maiores emissores de dióxido de carbono (CO2) do planeta, ao lado de grandes poluidores como Estados Unidos, China, Rússia e Japão, entre outros. O C02 é um dos maiores responsáveis pela elevação da temperatura global.

Um novo estudo do grupo formado por cientistas da Universidade de Brasília (UnB), Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Universidade de Washington para avaliar as conseqüências das queimadas na Amazônia revela um dado preocupante: os incêndios lançam, anualmente, 0,2 bilhão de toneladas de carbono na atmosfera. Somando-se esse valor ao de CO2 emitido na queima de combustível fóssil, chega-se a um total de 0,55 bilhão de toneladas.

O governo brasileiro trabalha na conclusão do Inventário Brasileiro de Emissões de Gases do Efeito Estufa, mas não adianta seus números. Uma parte importante do documento é destinada a avaliar o impacto das queimadas na emissão de CO2.

— O Brasil está certamente entre os dez maiores emissores do planeta em razão do desmatamento — garante o meteorologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, um dos revisores do inventário. — Comparativamente, o volume de emissões é muito menor do que o dos principais países, mas merece ser debatido, principalmente porque não está levando a um desenvolvimento econômico e social.

De acordo com dados da Administração de Informação de Energia dos EUA referentes à queima de combustível fóssil, os EUA emitem anualmente 5,75 bilhões e o Japão 1,2 bilhões. Mas o volume das emissões brasileiras já supera o de diversos países industrializados, como Canadá (0,48 bilhão) e Itália (0,45 bilhão).

— Os grandes vilões das emissões de CO2 sempre foram os países industrializados entre outras coisas porque normalmente utilizamos dados das indústrias — constata Carlos Alberto Gurgel, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da UnB e um dos autores do novo estudo. — Mas o que começamos a verificar é que, com a queima de milhares de hectares da Amazônia por ano, o Brasil está emitindo uma quantidade estupidamente alta de CO2.

O estudo, destinado a medir a quantidade de monóxido e dióxido de carbono liberados nas queimadas, concluiu que cada hectare (10 mil metros quadrados) destruído responde pelo lançamento de 69 toneladas de gases, sobretudo C02.

— O problema é que na Amazônia os incêndios chegam a atingir 50 alqueires (mais de um milhão de metros) — diz Gurgel. — Num caso desse, uma única queimada pode produzir mais de oito mil toneladas de CO2 por dia.

Desmatamento responde por 3% das emissões, diz governo O secretário-executivo da comissão interministerial incumbida de preparar o inventário sobre a emissão de gases no Brasil, João Domingos Miguez, garantiu ontem que os gases gerados pelo desmatamento das florestas no país não passam de 3% do total mundial de emissões. Ele, no entanto, se recusou a revelar os dados do inventário.

O relatório já está pronto, mas sua divulgação vem sendo estudada com cautela pelo governo, devido à grande repercussão internacional do tema. A divulgação estaria sendo protelada desde o governo anterior. O cálculo segue padrões internacionais estabelecidos pela ONU para determinar os volumes absolutos de emissões e é considerado superestimado por Miguez.

O secretário observa que os cálculos são processados como se toda área desmatada tivesse produzido gás, o que não ocorre na maioria das vezes porque, segundo ele, na maior parte das derrubadas não há queima de madeira.

— Mesmo com essa estimativa, o Brasil está longe de ser um dos maiores poluidores, está distante dos números dos Estados Unidos e da China, por exemplo. Duzentos milhões de toneladas de carbono não são nada se comparados aos 7 bilhões produzidos no mundo por ano — disse o secretário, que também coordena a área do Ministério da Ciência e Tecnologia destinada à mudanças do clima.