Mercado

2004/2005 uma safra difícil

1) CUSTO

Houve um aumento expressivo dos custos de produção em relação à safra passada. Os fertilizantes e sementes, por exemplo, estão em média 26% mais caros e as máquinas, 17%. Existe também a necessidade de conviver com novas pragas e doenças, como ferrugem asiática e morte súbita, que induzem gastos extraordinários no custeio da lavoura ou fortes perdas na produtividade média.

2) PREÇOS

O cenário de plantio se torna mais perverso quando se incorpora a perspectiva de preços, bem mais baixos do que os verificados no ano-safra 2003/2004. Com a recomposição dos estoques mundiais de grãos e algodão, graças à safra norte-americana elevada e também a perspectivas favoráveis para outras regiões, dificilmente a tendência de preços baixos será revertida.

A recente valorização do real frente ao dólar também acabou penalizando os agricultores, já que tem estimulado a importação, especialmente do Mercosul, de trigo, arroz e carne bovina, colocando um teto reduzido para os preços desses produtos no mercado brasileiro. Houve ainda desestímulo às exportações de milho, o que reduziu o piso para os preços domésticos, impedindo a operação de um mecanismo de ajuste muito útil e bastante utilizado no ano passado. O reflexo da combinação de preços mais baixos e custo mais altos é uma contração substancial de margem operacional dos produtores em praticamente todos os grãos e algodão, e em todas as regiões do País. Em vários casos a margem se aproxima de zero, em outros chega a ser negativa, gerando um problema para os agricultores muito alavancados financeiramente.

3) FINANCIAMENTO

Podemos separar duas fontes de financiamento: setor privado e setor público. No primeiro, é importante destacar as quebras de contrato de soja verde na última safra: estima-se que 1 milhão de toneladas de soja deixaram de ser entregues pelos produtores quando os preços em Chicago bateram recordes e, como conseqüência para a safra 2004/2005, deve haver redução de aproximadamente US$ 1 bilhão em adiantamento de custeio, um verdadeiro “tiro no pé” dos oportunistas de plantão. No caso do financiamento público, é importante reconhecer que houve aumento de recursos no Plano de Safra 2004/2005, mas ele ainda sofre de algumas distorções: (a) a liberação dos recursos tem ocorrido muito lentamente (situação agravada com a greve dos bancários), prejudicando o início do plantio – também penalizado pelo atraso das chuvas; (b) o volume de recursos por produtor foi mantido constante, o que se traduz em menos dinheiro por hectare, já que houve elevação dos custos. Além disso, o aumento no volume de crédito de custeio e de comercialização ocorreu, na maior parte, com juros livres, o que não estimula plantio. Os recursos a juros controlados tiveram incremento de apenas 8%, bem abaixo da alta verificada nos principais insumos.

4) PROTECIONISMO E GOLPES COMERCIAIS

Gostaríamos de chamar a atenção, ademais do caso da China com a soja, para o caso da Rússia, que bloqueou as importações de carnes brasileiras em função de um caso de febre aftosa no Estado do Amazonas. O oportunismo é tão grande que até a carne de frango foi travada, como se a ave pudesse ser contaminada por febre aftosa, uma doença que ocorre no casco do animal. Pior do que isso, é o fato de que tal protecionismo russo prejudicou a recuperação do mercado de suínos, após um longo período de difícil ajustamento.

5) INFRA-ESTRUTURA

O último aspecto negativo para a safra 2004/2005 refere-se a problemas ocasionados pela deficiência logística, um verdadeiro imposto sobre o setor agrícola brasileiro. Os gargalos da última safra certamente terão outra dimensão neste próximo ano. Primeiro, porque não houve avanço em infra-estrutura e, segundo, porque a safra deve ser maior num cenário de normalidade climática. Pesquisa realizada neste ano pela Confederação Nacional dos Transporte sobre a situação das estradas brasileiras revelou o que todos já sabiam: a situação piorou. Cerca de 75% das estradas foram classificadas como deficientes, ruins ou péssimas, ante 59% em 2003. O reflexo disso certamente será aumento do custo de frete (sem considerar a defasagem existente no mercado de diesel em relação ao preço internacional), atraso no escoamento da produção e perda de produto. Nos portos o horizonte também é grave, sobretudo quando consideramos perspectiva de aumento no volume embarcado. Particularmente no caso da soja, o impacto de prêmio negativo sobre os preços será muito mais prejudicial, já que em muitos casos significará aumento do prejuízo do agricultor.

O cenário, no entanto, é mais favorável para um segundo grupo de produtos, composto por café, laranja, açúcar e álcool. O primeiro encontra-se em uma trajetória de recuperação de margem, após um longo e duro período de crise que se iniciou em 1999. O segundo deve ser beneficiado pelos problemas verificados na safra da Flórida após a passagem dos furacões no último mês. Por fim, o setor sucroalcooleiro está sendo beneficiado pela elevação dos preços internacionais do petróleo, pelo brilhante aumento de vendas de veículos flex-fuel e pela quebra da safra indiana de açúcar. Esses fatores, somados à competitividade da produção nacional do setor, estão garantindo a recuperação da demanda interna e externa e dos preços de açúcar e álcool do Brasil.

José Roberto Mendonça de Barros, Glauco Carvalho e Alexandre L. Mendonça de Barros são economistas da MB Associados e da MB Agro.