Puxa, estou tão aliviado porque o Congresso finalmente chegou a um acordo sobre a lei de energia! Agora que isso está fora do caminho, talvez o Congresso se dedique a solucionar nosso problema de energia.
Desculpem-me por ser tão cínico, mas uma lei de energia que não obriga nossas companhias de automóveis a melhorar acentuadamente seus padrões de consumo de combustível simplesmente não é séria. Essa lei é o que o especialista em energia Gal Luft chama de “a soma de todos os lobbies”. Enquanto ela encerra alguns dispositivos úteis, também contém muita carne de porco [gíria para benefícios oficiais] oferecida aos interesses que menos precisam -como as companhias de petróleo- e não tem uma estratégia abrangente para enfrentar o novo mundo.
E o mundo mudou nos últimos anos. Primeiro, o campo do jogo econômico global está sendo nivelado, e milhares de pessoas que estavam fora do jogo -da China, da Índia e do ex-império soviético- hoje estão entrando em campo, cada uma sonhando com uma casa, um carro, uma torradeira e um microondas. Enquanto elas passam de pequenos para grandes consumidores de energia, tornam-se cada vez mais nossas concorrentes pelo petróleo.
Segundo, estamos em guerra. É uma guerra contra as sociedades abertas montadas por islâmicos fascistas, alimentadas pelas mesquitas, instituições beneficentes e madraças, que pregam um tipo intolerante de islamismo e são financiadas por regimes medievais sustentados por nossas compras de petróleo.
Sim, estamos financiando os dois lados da guerra ao terrorismo: nossos soldados e os fascistas terroristas. O fracasso de George W. Bush, na manhã seguinte ao 11 de Setembro, em pedir aos americanos que aceitassem um imposto sobre a gasolina para conter nossas importações de petróleo foi uma das maiores oportunidades desperdiçadas na história dos Estados Unidos.
A lei de energia começa a remediar isso? Dificilmente. Ela não afeta realmente as companhias de automóveis, que usaram a maioria dos avanços tecnológicos das duas últimas décadas para fazer carros maiores e mais rápidos, em vez de mais eficientes em consumo. O Congresso dos EUA chegou a rejeitar a idéia de classificar os pneus conforme a eficiência em consumo de combustível, o que poderia ter incentivado os consumidores a comprar as marcas mais eficientes.
E a Casa Branca? Bloqueou uma emenda que teria exigido que o presidente encontrasse maneiras de cortar o consumo de petróleo em 1 milhão de barris por dia até 2015 -sob a alegação de que poderia exigir a imposição de um menor consumo de combustível aos fabricantes de carros.
Precisamos de uma abordagem estratégica da energia. Precisamos reformular o trabalho para que mais pessoas trabalhem em casa; precisamos reconfigurar nossos carros e o transporte de massas; precisamos de uma definição mais ampla do que pensamos como combustível. E precisamos de uma política fiscal que ao mesmo tempo incentive e obrigue as firmas americanas a ser inovadoras em soluções de energia verde. Essa vai ser uma enorme indústria global -na medida em que a China e a Índia se tornarem consumidores de alto impacto- e deveríamos liderá-la.
O Brasil e o álcool
Muitas tecnologias que poderiam fazer diferença já existem -desde motores híbridos até o etanol.
“Durante o embargo do petróleo árabe em 1973, o Brasil importava quase 80% de seu suprimento de combustível”, diz Luft, diretor do Instituto para Análise de Segurança Global. “Em três décadas, cortou sua dependência em mais da metade… Nesse período, os brasileiros investiram maciçamente em uma indústria de etanol baseada no açúcar, a tal ponto que cerca de um terço do combustível que eles usam em seus veículos é cultivado no país. Eles também criaram uma frota que pode utilizar o combustível.” A metade dos novos carros vendidos neste ano é bicombustível. “Fazer hidrocarbonetos e carboidratos viverem felizes no mesmo tanque de combustível”, acrescentou, “não só deixou o Brasil próximo da independência energética como também protegeu a economia do impacto da atual alta dos preços do petróleo.”
A nova lei energética inclui o apoio ao etanol baseado no milho, mas, atendendo aos ditames dos lobbies americanos do milho e do açúcar (que se opõem às importações de açúcar), ela ignora o etanol baseado em açúcar, no estilo brasileiro, embora ele exija muito menos energia para produzir e produza mais energia do que o etanol baseado no milho. Estamos prontos para importar petróleo da Arábia Saudita, mas não açúcar do Brasil.
Parece que somente uma grande crise vai obrigar nosso país a descartar todos os lobbies cínicos e mudar nossa maneira de utilizar energia. Eu pensei que o 11 de Setembro fosse essa crise. Certamente foi para mim, mas, ao que parece, não para esta Casa Branca, este Congresso ou muitos americanos. Será que realmente teremos de esperar por algo maior para ficarmos mais inteligentes?