Trinta anos após o pontapé inicial, o programa brasileiro de incentivo ao consumo de álcool combustível tornou-se modelo em todo o mundo e abriu as portas de um enorme mercado para as exportações brasileiras. O álcool já se consolidou como o principal substituto da gasolina e, em tempos de petróleo e preocupações ambientais em alta, é cada vez maior o número de países que aderem ao combustível, renovável e menos poluente que seu concorrente fóssil.
Em 1º de novembro, foi a vez da Colômbia iniciar a mistura de álcool à gasolina, em um movimento saudado pela imprensa local como o início da era do etanol (como é mundialmente mais conhecido o derivado da cana-de-açúcar). Geração de empregos, economia de divisas com a importação de derivados de petróleo e redução das emissões de monóxido de carbono foram apontados pelos colombianos como as principais vantagens do produto em relação aos seus concorrentes. Há uma visão cada vez mais clara, principalmente em países desenvolvidos, de que a preocupação com o uso de energia de qualidade, que permita a redução das emissões de carbono, está ao lado de temas importantes, como a pobreza e o combate ao terrorismo, diz o diretor da União da Indústria Canavieira (Unica), Luiz Cláudio Correia de Carvalho, especialista no mercado internacional de combustíveis. A disparada do preço do petróleo nos últimos anos ampliou essa preocupação, a ponto de o governo norteamericano iniciar as discussões sobre uma nova legislação para os biocombustíveis.
Essa onda já começa a beneficiar o Brasil, com aumento das exportações do produto e redução do consumo interno de gasolina. Atualmente, o álcool representa 2,6% da matriz mundial de combustíveis automotivos, conta o presidente da consultoria Datagro, Plínio Nastari, e a tendência é que o crescimento dessa participação ocorra em progressão geométrica.
O exemplo brasileiro mostra onde se pode chegar: aqui, cerca de 40% da energia consumida em veículos de passeio é produzida a partir da cana-de-açúcar. Nos Estados Unidos, esse número gira em torno dos 2,5%.
Nastari aposta que o potencial do álcool será maior à medida que os motores automotivos atuais sejam substituídos pela nova tecnologia de célula combustível, que dará início à era do hidrogênio. Ele explica que o álcool tem um teor de hidrogênio muito maior que seus concorrentes derivados do petróleo, sem demandar grandes alterações nas redes de distribuição de combustíveis. Mais uma vez, o Brasil pode despontar como opção de fornecimento, já que a produção de álcool a partir da cana é muito mais barata que as alternativas usadas atualmente. Aqui, o custo de produção do álcool é de US$ 0,23 por litro.
Nos Estados Unidos, onde o álcool é produzido a partir do milho (bastante subsidiado), esse valor sobe para US$ 0,31. Na França, que usa a beterraba como matéria-prima, o custo pode chegar a US$ 0,50 por litro.
DESCONCENTRAÇÃO
Do ponto de vista geopolítico, é a grande chance para o mundo sair de uma lógica global que se baseia em concentração de fornecimento para uma desconcentração, com produção de combustível em diversas regiões, avalia Carvalho, lembrando que grande parte da produção mundial de petróleo vem do Oriente Médio.
Hoje, diz Nastari, pelo menos seis países latino-americanos já iniciaram a produção de álcool para fins combustíveis: Paraguai, Colômbia, Guatemala, El Salvador e República Dominicana. Outros quatro na África – Zâmbia, Suazilândia, Sudão e Somália – são grandes candidatos a produzir. A Índia iniciou um programa de incentivo e há estudos na Tailândia e na Austrália. Todos motivados pelos avanços regulatórios, principalmente entre os países ricos, que avaliam a adição de biocombustíveis a derivados de petróleo.
Nos últimos meses, a Petrobrás fechou acordos de exportação do combustível para a Venezuela e a Nigéria e negocia embarques também para o Japão.